maio 04, 2012

José Tavares deve ser considerado um dos maiores pintores de Espinho e todos ganhamos em o reconhecer - antes de mais a terra a as gentes que nas telas transformou em obras-mestras. Não quero com isso dizer que ele não pertença ao património artístico do País, mas sim realçar a evidência de que o “seu Portugal” começava nesta cidade de mar e de dura faina da pesca, onde se aventuram homens de rostos marcados pelo sol e pelo sal das bátegas do Atlântico - um tema recorrente, fonte de inspiração, de emoção estética, e, também, de solidariedade humana, que emana de muitos dos belíssimos óleos, aguarelas e desenhos, que nos deixou. É, a meu ver, sobretudo, um admirável pintor de rostos, porque para além da perfeição dos traços fisionómicos, sabe transmitir a força expressiva de sentimentos e vivências, em que o sujeito está de corpo e alma. É evidente gosto, empatia pelas pessoas que retrata, a começar pelos mais humildes, os pescadores e as vareiras, as camponesas, os velhos, os marginais, os deserdados de uma sociedade dividida entre extremos de privilégios e de carências… As suas temáticas enriquecem-se nos contrastes, tanto podem contar histórias de vida, em quadros de um inteiro realismo, como abrir espaço ao devaneio, à formosura idílica das coisas da natureza e das criaturas, libertas de amarras e transportadas a um éden de fantasia. Há nestas, em particular, puros poemas de luz e de cor, escritos a pincel, como em outras há a denúncia das injustiças e dos injustiçados - a arte como instrumento de afirmação de convicções, de sensibilidade e consciência social. Por demasiado tempo José Tavares permaneceu, até para a generalidade dos seus conterrâneos, um desconhecido, embora muito talentoso, artista. Talvez por opção própria, por não querer assumir - se como tal, levado pela simplicidade e discrição, que eram traços bem atraentes da sua maneira de estar face aos outros. Um homem extremamente amável e comunicativo, mas avesso a toda e qualquer forma de ostentação ou exibicionismo. E, por isso, não terá percorrido - como poderia ter acontecido - , uma trajectória ascensional, firmada em sucessivas mostras e exposições, pelo País e pelo estrangeiro, que lhe teria dado visibilidade, êxito material e renome merecidos. Mas, se não o motivou a vontade de vencer pelo sucesso nesses domínios, moveu-o, sempre, a vocação, o propósito de procurar nas Artes Plásticas uma forma de realização, de felicidade, de extroversão de sentimentos, que está na origem de um legado enorme, qualitativo e quantitativo, que todavia, permaneceu num círculo reservado de amigos e admiradores. A sua aptidão cedo se manifestara, e levara-o a escolher o curso de Belas Artes, que, porém, não completou, porque teve de procurar numa tipografia industrial, bem cedo, o primeiro emprego. Nesse sector permaneceu sempre e nele veio a estabelecer-se, mais tarde, como empresário. E, assim, quer através da via profissional, quer pelo generoso envolvimento na comunidade espinhense, muitos e muito diversos foram os contributos e trabalhos em que o seu virtuosismo se manifestou - em capas de livros, em ilustrações, em graciosos desenhos para crianças, na concepção de cabeçalhos de jornais... O espólio de José Tavares é, pois, imensamente heterogéneo e multifacetado - a única constante é a busca conseguida da harmonia e da beleza em tudo o que saiu de suas mãos. A pintura, por muitos anos, até que se reformou, ocupava apenas as horas vagas, mas foi sempre a resposta a um chamamento antigo. Foi, de facto, o talento, de que fala a parábola, bem multiplicado. Foi a vocação cumprida. Sobre esta publicação, iniciativa da família, em especial do filho, Paulo Tavares, julgo ser devida uma palavra de agradecimento e de apreço José Tavares é parte da vida de todos os que tiveram a sorte de ser seus amigos. Mas é, também, como disse, parte da história cultural de Espinho, a terra onde criou raízes, onde deixou um rasto de humanidade e simpatia, onde à Arte se dedicou. E, por isso, é tão importante a recolha e publicitação de uma parte das suas telas, que se constitui, afinal, no meio de divulgar obras que estão, na quase totalidade, inacessíveis em colecções particulares, e que apenas numa pequena parte foram objecto de duas exposições promovidas pelo Paulo Tavares e patrocinadas pela Câmara Municipal de Espinho (em 2004 e 2010) . As imagens aqui reunidas (que são as da primeira daquelas exposições) vão permitir que o Artista surja, assim, aos olhos dos conterrâneos e aos olhos do País, que se valoriza ao valorizá-lo. Um livro de Arte é sempre um convite a revisitar um mundo, onde sempre podemos descobrir o perene e o novo, num diálogo infindo com o seu criador. Maria Manuela Aguiar

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