dezembro 12, 2015

2005 – 2009 Os Encontros para a Cidadania - a igualdade entre mulheres e homens
Com Maria Barroso na Diáspora
O 1º Encontro Mundial de Mulheres presentes no associativismo e no jornalismo da Diáspora foi, em 1985, a primeira manifestação de uma política para a igualdade na Diáspora, política que, após um hiato de 20 anos, seria relançada pela Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, em 2005
Para presidir aos Encontros, o Secretário de Estado António Braga convidou a Dr.ª Maria Barroso – ninguém como ela poderia ser o rosto de um projeto de inclusão de género e geração na vivência plena da cidadania, em todas as comunidades portuguesas.
Era uma parceria Estado/sociedade civil, que envolveu na organização dos Encontros, ao longo de quatro anos a colaboração da AEMM, da Fundação Pró Dignitate e outras ONG’s do País e da Diáspora.
A Dr.ª Maria Barroso estivera presente nas iniciativas da AEMM, desde a primeira hora, como nós estivemos com ela nos quatro cantos do mundo, em todos estes verdadeiros congressos com que se fazia História da democracia portuguesa, levando a aplicação das políticas públicas da igualdade para fora dos limites territoriais.
As portuguesas da Diáspora tinham perante si um exemplo vivo da Mulher e Cidadã, que soube, sempre, de uma forma tão caracteristicamente feminina fazer muita coisa, ao mesmo tempo, e tudo muito bem – ser a mãe de família e a mulher, ser um expoente na vida profissional, na vida política, no voluntariado, na cultura.
Acho que foi determinante para apropriação do espírito do projeto por cada uma, por cada um dos presentes o facto de terem perante si uma Mulher-símbolo, que era também uma pessoa encantadora, simples e solidária. A mensagem passava, com a força da sua palavra e do seu sorriso. Todas a sentíamos como “uma de nós”, sem nunca esquecer a sua absoluta excecionalidade.
De Buenos Aires (2005) a Estocolmo (2006), de Toronto (2007) a Berkeley e a Joanesburgo (2008), reunimos com representantes das comunidades de toda a América do Sul, das duas costas da América do Norte, da Europa, da África e, em 2009, em Espinho, pudemos realizar no “encontro dos encontros”, o balanço desta experiência inédita, do ambiente em que fora vivida, das esperanças que despertara, do impacte que se prolonga até hoje, em novas iniciativas, deixando-nos a convicção de que há um período antes e depois deste encadeamento de congressos, no que respeita à política de Estado para as comunidades, e, sobretudo na consciência das questões de género, a nível das comunidades, no florescimento de novos movimentos norteados pela ideia da paridade

Buenos Aires
Na Biblioteca Nacional, o auditório Jorge Luís Borges esteve sempre cheio, foi durante os dias do congresso um espaço luso-argentino, ouvia-se o português e o castelhano, falou-se de Regina Pacini, a portuguesa que foi até hoje, a única primeira-dama estrangeira do País. A Embaixada e o Instituto Camões deram uma enorme colaboração, o Embaixador e a Embaixatriz ambos participaram ativamente nas sessões. Marcante a presença de Maria Kodama.. O mundo associativo e o mundo cultural estiveram em evidência. A cobertura mediática foi excelente, RTP. RDP. TSF, imprensa nacional e regional. Nunca se falara tanto não só das mulheres como das comunidades portuguesas da Argentina. António Braga reconhecia que as questões de género tinham andado até li muito esquecidas… Respirava-se um ar de mudança. No final, a Presidente Maria Barroso, como que sintetizando as conclusões, diria: "Considero que foi uma reflexão aprofundada sobre os problemas que dizem respeito às mulheres, e, em particular, às mulheres migrantes. Mulheres e Homens têm de assumir um papel onde ambos os géneros contribuem para a melhoria da sociedade"
A Mulher Migrante Portuguesa da Argentina, co-organizadora local do Encontro estava de parabéns e festejou, no dia seguinte o seu aniversário na Associação de Echevarria. Partimos todos de Buenos Aires para lá num modesto autocarro, que a presidente Maria Barroso insistiu em partilhar connosco.

Estocolmo
Co-presidiram ao Encontro Maria Barroso e Anita Gradin, antiga Ministra da Imigração do Governo de Olaf Palme, Comissária Europeia e Presidente da Internacional Socialista de Mulheres. Duas grandes Mulheres, porque Anita é, igualmente, um nome mítico no seu país, onde foi a primeira responsável pela aplicação do sistema de quotas (uma amiga de longa data da Dr.ª Maria de Jesus, e, por sinal, minha, também). O Secretário de Estado Jorge Lacão e outros homens ilustres, tornaram o Encontro quase paritário. E a Dr.ª Maria Barroso salientou: "É muito importante que os homens estejam presentes, não queremos uma sociedade de mulheres, mas antes de homens e mulheres conscientes dos seus direitos e deveres".
Uma ênfase na ideia da cidadania feminina para o serviço da comunidade, que nos leva a vê-la, como uma mulher eminentemente moderna no século XXI, na linha precursora dessa plêiade de Portuguesas que, no começo de novecentos, lutaram pela igualdade de sexos.

Toronto
A conferência atraiu ativistas dos direitos humanos, deputadas canadianas, universitários, investigadores, dirigentes associativos, mulheres e homens, e uma ampla cobertura dos “media” em língua portuguesa de Toronto (que são muitos e muitos de qualidade), permitindo que as mensagens chegassem à comunidade inteira.
O Secretário de Estado Jorge Lacão, o Embaixador que veio de Otava, o representante dos Açores, a Cônsul-Geral Maria Amélia Paiva (unanimemente elogiada pela organização da" Conferência") e muitos outros intervenientes lembraram o caminho percorrido e o que falta percorrer. A lei da paridade esteve no centro do debate
A Dr.ª Maria Barroso, falou de um tempo novo ("A Mulher de hoje pode governar uma Nação"), que exige mobilização e persistência. “Temos muito que lutar para que a igualdade entre homens e mulheres seja uma realidade, mas tenho a certeza de que um dia venceremos. Já não será para mim, mas para aquelas que nos darão continuidade".
Na despedida, depois dos plenários de trabalho, das visitas a instituições da comunidade de Toronto, fica a frase de Jorge Lacão, que a imprensa reproduziu amplamente: "Viemos ver coisas extraordinárias."
Antes mesmo da Conferência, Maria Barroso tinha aceite um convite da comunidade de Montreal para celebrar o Dia Internacional da Mulher. Chegara ao Canadá na noite anterior, levantou-se de madrugada para um voo matutino, cumpriu um programa intenso, visitas à Câmara Municipal, a organizações da comunidade, almoço num restaurante português, onde discursou, ao lado do Cônsul Geral e da Ministra da Imigração. Falou de democracia e de futuro. Recebeu uma infindável ovação, muitos não continham lágrimas de emoção. Regressou tarde a Toronto, sem dar mostras de cansaço, sob a neve e a ventania gélida de um Março invernoso. Ninguém notou, mas Maria Barroso estava com um princípio de gripe, tinha febre, Nós sabíamos, mas não conseguimos que se resguardasse um pouco. Era assim mesmo, era filha de um militar. Estava em pleno combate pelas suas causas.

 Joanesburgo

As mulheres predominavam nas belas instalações do “Lusito” (ou não fosse o Encontro da responsabilidade da eficiente “Liga da Mulher Portuguesa na África do Sul), mas havia um significativo número de homens, o Embaixador, o Cônsul-Geral, conselheiros do CCP dirigentes das principais instituições comunidade, para ouvir a Presidente Maria Barroso falar da situação das mulheres através dos tempos e no nosso tempo e lembrou-nos que "apesar da História ter sido tecida por Mulheres e Homens só a estes é dada relevância"
Falou de uma nova agenda de temáticas em que as mulheres podem fazer a diferença - a denúncia da violência nos media, o racismo e a xenofobia, a indiferença perante tantos atropelos dos direitos humanos…
 E houve ainda tempo para a nostalgia, para a Dr.ª Maria Barroso encontrar amigos que conheceu em circunstâncias dramáticas, quando do acidente do filho. E recordar um prévio encontro com o Embaixador Paulo Barbosa, em Israel, durante uma visita presidencial, que coincidiu com a trágica morte de Itzak Rabin, um grande amigo de Maria Barroso. Pedaços da história à qual ela pertence para sempre.
Na sessão de encerramento, o SECP António Braga manifestou o seu inteiro apoio ao movimento de mudança que ali se confirmara e anunciou a realização em 2009 de um Encontro Mundial de Mulheres em Portugal.

Elizabeth e Berkeley

A caminho da costa oeste, uma breve estada em Elizabeth, NJ, a convite de Monsenhor João Antão, e da paróquia portuguesa de Nossa Senhora de Fátima, em cujos salões se realizou um primeiro encontro de formação de jornalistas lusófonos, centrado nas temáticas da Paz e da Igualdade. Uma visita às Nações Unidas, outra a um Liceu de Elisabeth, muito prestigiado, e que tem o nome de Monsenhor Antão, (uma honra num país onde é raro atribuir a instituições públicas o nome de pessoas vivas).
Em Berkeley o tema do Encontro era "O papel da Mulher no futuro do associativismo e movimentos cívicos da Califórnia", pondo o enfoque nas questões do associativismo feminino, (com introdução da grande especialista Profª Deolinda Adão), da colaboração intergeracional, do papel dos media na formação para a igualdade, seguido de um encontro informal com estudantes e professores de Berkeley, na companhia do SECP António Braga
Ao abordar, tanto em Berkeley como em Elizabeth, o tema da interculturalidade entre comunidades migrantes de diferentes países que se expressam em Português, Maria Barroso, mostrava acreditar que, também neste domínio, o entendimento entre as mulheres migrantes dos vários quadrantes da lusofonia pode fazer a diferença – no que todos nós a secundávamos (1).
.OBAMA
No regresso a Portugal, nova passagem por Elizabeth e pela paróquia portuguesa. Monsenhor João surpreendeu a Dr.ª Maria Barroso com a mais bela das homenagens: nos poucos dias da nossa ausência na Califórnia, Roger Gonzalez um talentoso artista, pintara o seu retrato, à entrada da ala da residência onde ficou hospedada
Ao findar um périplo por tantas comunidades, a Presidente dos Encontros deixava, assim, o seu retrato num mural na América do Norte, tal como deixara, por todo o lado, o retrato de corpo inteiro de uma cidadã, a mobilizar, pela palavra e pelo exemplo, pelo advento de sociedades, mais livres, mais abertas a todos, ou seja, mais humanas.

Maria Manuela Aguiar

dezembro 11, 2015

OS PRIMEIROS CONSELHOS REPRESENTATIVOS DE EMIGRANTES NO SÉCULO XX - a França e Portugal
I - O CONSELHO SUPERIOR DOS FRANCESES DO ESTRANGEIRO
Na primeira metade do século XX, dois Conselhos de Emigrantes foram criados na Europa, como instrumentos de representação dos cidadãos residentes no estrangeiro e ambos estão ainda em plena atividade no século XXI- o suíço e o francês. Um e outro são oriundos de grandes movimentos transnacionais, configurando, porém dois modelos distintos. O suíço, mais antigo, mantém a sua natureza privada até hoje, dirigindo-se ao governo, como um interlocutor direto, mas exterior à sua orgânica, em áreas culturais e sociais, só mais tardiamente se centrando nas questões de participação política, O segundo foi impulsionado pela "Union des Français de l' Étranger" (UFA), que, praticamente desde o início da sua atividade, nos anos 20, apela à institucionalização da colaboração com o Estado, colocando o enfoque na igualdade de direitos entre residentes e expatriados, e no direito de voto nas eleições nacionais.
O início de novecentos, foi um tempo de grande expansão de movimentos associativos de povos europeus, que formaram, cada um deles, extensas redes internacionais, com as suas cúpula federativa ( 1 ), a coincidir com o aumento de vagas migratórias da Europa para as Américas, favorecido pelo progresso tecnológico e embaratecimento dos custos das viagens transoceânicas, Esta é uma realidade que nós próprios exemplificamos , com um êxodo para o Brasil em números jamais vistos, embora sem acompanhar a tendência para a internacionalização do seu associativismo, fortíssimo a nível local, mas avesso a ultrapassar as fronteiras de uma cidade, ou, quando muito, de um país. (2).
Todavia, à época, só em França, no discurso da UFA, aflorou a clara consciência da situação de discriminação dos expatriados no plano político, com a reclamação da igualdade de exercício de direitos da cidadania face ao país de origem. A pertinência dessa pretensão era evidente, reconhecidos os laços de pertença culturais, económicos, afetivos, que mantinham com a pátria, mas a força do dogma territorialista - a soberania exercida estritamente dentro de fronteiras - assim como a preocupação de não abrir precedentes que obrigassem a dar reciprocidade a estrangeiros (num país de imigração mais do que de emigração), levou sucessivos governos a rejeitarem tão ousada proposta.
O que explica o pioneirismo do Conselho francês? Em parte, certamente, a história da República, a tradição de representação das antigas colónias, pela via de Conselhos Superiores, mas, sobretudo, a visão e cultura política do fundador e principal dirigente da UFA, Gabriel Wenlé, terão sido decisivas para lançar a utopia da igualdade de direitos de cidadania dos emigrantes no centro do debate. A proposta teve o apoio imediato do Presidente Briand, mas a invencível oposição de sucessivos Governos e da Diplomacia. Wernlé soube contornar os obstáculos e encontrar, uma solução de compromisso, avançando com uma fórmula inovadora de intervenção dos expatriados no espaço público (3 -a silva), através de um orgão de consulta governamental, porta voz dos seus interesses e aspirações, que viria a ser criado em 1948, após duas décadas de porfiados esforços, com a designação de "Conséil Supérieur des Français de l' Étranger"
A sua constituição fora precedida pela presença de um pequeno núcleo emigrantes franceses no Conselho Consultivo da Resistência Francesa, que funcionou, sob a égide do General De Gaulle, como forum da França livre, durante a 2ª Guerra mundial. Teve a sua 1ª reunião em 1943, na Argélia, reunindo 83 homens, 5 representantes dos expatriados, e apenas uma mulher, Marthe Simard, membro da resistência no Canadá.
Essa primeira ligação entre expatriados em razão da guerra e emigrantes, em sentido estrito, foi continuada no Conselho Superior dos Franceses do Estrangeiro, onde os antigos combatentes, enquanto tal, tinham assento, entre os “membros de direito” juntamente com representantes da UFE, das Câmaras do Comércio e dos professores, a par dos 45 “membros eleitos” pelas associações (4) e dos 5 “membros nomeados” pelo Ministro dos Negócios Estrangeiros, que presidia ao órgão consultivo. Entre as mais importantes prerrogativas deste Conselho estava e está, a de escolher os senadores dos franceses do estrangeiro (processo em que só intervêm os membros eleitos). O voto dos residentes no estrangeiro para a Assembleia Nacional tardaria em ser reconhecido, pelo que o Conselho (com a sua conexão ao Senado) era a grande instituição onde tinham voz. E, mesmo depois que os direitos de participação política foram sendo atribuídos, não perdeu importância, como via de uma representação específica – a veste em que influenciou todos os organismos semelhantes, que vieram a ser criados, na década de 80, nos países europeus de forte emigração – Portugal, Itália e Espanha. (5) AR audição
O Conselho reúne em plenário anualmente (entre as sessões anuais funciona, com regularidade a Comissão Permanente) e aprova relatórios, resoluções, dá pareceres, faz interpelações sobre todas as matérias que interessem aos residentes no estrangeiro – direitos políticos, nacionalidade, ensino, pensões, assuntos económicos…(5) Joelle o melhor e o pior).
Em 1982, O Conselho Superior passou a ser eleito por sufrágio direto e universal (modo de eleição adotado pelos homólogos italiano e espanhol, que são posteriores a essa data). Foi “constitucionalizado” em 2003 (art. 39 da Constituição) e, em 2004, alterou a sua designação para Assembleia dos Franceses do Estrangeiro.
Os conselhos existentes na Europa têm, evidentemente, a sua própria história, com soluções e modos de atuação concreta muito diversos, mas tendo finalidades análogas, julgo que ganhariam em manter, a nível europeu, um diálogo, que tarda, sobre os seus êxitos e dificuldades, como meio de aperfeiçoar o modelo e a prática de uma instituição ainda com muitas virtualidades a explorar. O Conselho português, de que vamos falar mais detalhadamente, foi de todos, o que teve vida mais acidentada e a análise comparativa poderá, ajudar a compreender algumas das razões do seu relativo insucesso, a par das singularidades que o diferenciam positivamente
II - O CONSELHO DAS COMUNIDADES PORTUGUESAS (CCP)
1 -Fazer a lei
Nas eleições intercalares de 1979, o programa eleitoral do governo da AD previa a criação de um "Conselho das Comunidades Portuguesas no Mundo, onde estas se poderão fazer representar" (6). Tratava-se de um organismo inédito, sem tradição jurídica e política entre nós, que seria instituído pelo governo. Em direito comparado, o único paradigma que se oferecia ao legislador era o francês, apesar das diferenças de condicionalismos e, consequentemente, de problemas aos quais procuravam respostas. No caso português. sem qualquer âncora no passado colonial ou na situação de antigos combatentes (7), num quadro cconstitucional que consagrava já a representação dos emigrantes na Assembleia da República, mas perante a ausência de agregação das suas comunidades orgânicas disperrsas pelo mundo. Assim, enquanto em França a questão política era central e levantada por uma organização de cúpula do associativismo, em Portugal era o próprio movimento associativo muito dinâmico localmente, mas incomunicável, a nível transnacional, que se queria unir " casa comum" de cultura (8).
Era preciso adaptar o figurino alheio a realidades próprias e trabalhar depressa Foi constituído, em início de janeiro, no gbninete da Secretária de Estado das Comunidades Portuguesas, a quem estava cometida a tarefa, um grupo de trabalho, coordenado pela Drª Fernada Agria. Cerca de um mès depois, ouvidos especialistas efuncionários da SEECP. dplomatas e deputados da emigração, o anteprojeto estava concluido e foi enviado a Conselho de Ministros, onde veio a ser provado a 1 de abril.
A falta de ampla audição das comunidades seria suprida, através da consulta aos eleitos, na primeira reunião do CCP. A lei que dava suporte à nova instituição seria aí repensada, num forum, que sem perder a natureza consultiva, funcionaria à maneira de uma assembleia constituinte. Foi, por isso, por proposta do governo que, entre as seis secções previstas, se destinava à revisão do DL 373/80 de 12 de setembro - secção que seria vista, por todos, como a mais importante, muito participada, em grandes debates, com naturais afrontamentos que acabaram em consenso. Foi essa vontade comum de existir, que verdadeiramente fez da da lei uma realidade viva e a levou pelos caminhos que escolheu - privilegiando o tratamentos dos problemas sociais do quotidiano da emigração recente, e assuntos jurídicos e políticos com ela relacionadas ,nessa medida divergindo dos congressos de Adriano Moreira, com o seu discurso eminentemente cultural. e do organismo prefigurado no programa do governo, que ia no mesmo sentido).
Em qualquer dos casos, qualquer que fosse a forma como modelasse, no interior, a lei á sua imagem, o CCP era um espaço de encontro dos portugueses do mundo inteiro com Portugal, uma força para ajudar a mudar o estado de coisas, o desinteresse geral do país pela sua emigração. .
Mais do que colocar os conselheiros, frente a frente, numa sala de reuniões fechada, a falarem entre si e com um representante do governo, pretendia-se pô-los em contacto com a sociedade civil e com responsáveis da administração pública, dar-lhes voz nos "media", presença tangível, junto da opinião pública, criar vontades de colaboração mútua
Essa é justificação, ainda hoje largamente incompreendida, para heterogeneidade da composição do órgão consultivo, com o seu núcleo central, os conselheiros eleitos no universo associativo, os observadores da comunicação social, mas também outros interessados - oriundos das organizações sindicais e patronais, parlamentares, perito nas matérias a debater - e, obviamente, da contraparte oficial no diálogo, o Ministro (ou o Secretário de Estado de Estado).os representantes dos Governos das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira. O facto de outros participantes darem opinião no debate aberto, ou de as assessorias (dos diversos departamentos ministeriais) se pronunciarem sobre aspetos técnicos, era antecipada como contributo facilitador do parecer final e não prejudicava a autonomia dos eleitos... A audição era dos conselheiros, não dos sindicalistas, dos políticos, ou dos servidores públicos. E basta compulsar o acervo das recomendações, que se encontram publicadas pelo Centro de Estudos da SECP, para constatar que elas são genuinamente dos portugueses do estrangeiro. Aliás, das atas das diversas secções da 1ª reunião, ressalta a raridade das intervenção dos membros não eleitos, com exceção do presidente do CCP, e mal seria que este não consultasse verbalmente o órgão de consulta, ou não respondesse, logo ali, a questões colocadas (10)
Na recomendação 99 (que se desdobra numa multiplicidade de recomendações, todas as que foram aprovadas na Secção) os conselheiros exprimiam uma vontade clara de reduzir o CCP ao núcleo dos eleitos (admitindo que estes fossem ou não, membros de associações, ou seja, admitindo, também, candidaturas individuais), mas abriam, pela via de convites seus, as portas dos CCP a todas as categorias de participantes previstos na Lei 373/80.
O que me parece evidenciar:
- o reconhecimento das vantagens de dialogarem com uma pluralidade de audiências num forum alargado:
- a comprovação do bom relacionamento humano que se conseguiu na 1ª reunião, àquem e além das muitas discussões e controvérsias.
- a vontade de independência total, face ao governo - incluindo o MNE, que seria um convidado como qualquer outro.
(convenhamos que isso seria insólito, num órgão de consulta governamental, (à francesa), embora decorra da própria natureza das coisas numa organização privada (modelo suíço )
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2 - A primeira reunião - 6 a 10 de abril de 1981
Se foi célere a elaboração da legislação, em 1980, durante o VI Governo Constitucional, não menos o foi o processo de organização das primeiras eleições, de acordo com as normas transitórias previstas no DL 373/80. convocatória pelas embaixadas ou consulados dos delegados das associações legalmente constituídas na sua área e eleição por esse "colégio eleitoral" do número de representantes decorrente da aplicação dos critérios legais.
Futuramente, as "Comissões de País" reuniriam, para o efeito, por direito próprio.
A lei não definia a dimensão, nem modo de funcionamento das Comissões, o mesmo se dizendo da organização por área consular. O número de efetivos, atividades, papel a nível local, tudo era decidido pelos respetivos membros, eleitos de entre as associações legalmente constituídas, que se inscrevessem na "Comissão". Estabelecia-se, assim, uma completa descentralização, julgada imprescindível face a realidades tão díspares, como são as das comunidades dos 5 continentes. Onde existisse já uma federação - caso do Brasil - podiam funcionar quase só como colégio eleitoral. Em comunidades mais divididas, esperava-se que pudessem contribuir para reforçar a cooperação inter associativa e a sua expansão. Mas não se interferia (11).
O VII Governo Constitucional tomou posse em Janeiro de 1981 e a reunião realizou-se, decorridos 3 meses, em abril, no salão nobre do Palácio Foz. A abrir os trabalhos, a Secretária Geral, Fernanda Agria lembrava que "o próprio diploma criador do Conselho está, de certa maneira, e ser testado na realidade da prática".
Na qualidade de Presidente do Conselho das Comunidades, eu própria salientei o carater histórico daquele momento: "Estamos a participar no primeiro ato da vida de uma nova instituição - o CCP - que, estou certa, virá a desempenhar, como todos esperamos e desejamos, durante muito tempo e ao longo de muitas gerações, um papel de relevo, meritório e eficaz, no conjunto das instituições nacionais".
E, mais adiante, caracterizava o CCP como "uma instituição mediadora entre a sociedade civil e o Estado", dizebdo: "Não temos, infelizmente, em Portugal, uma tradição muito rica neste género de instituições (...) o CCP, no seu processo de funcionamento, terá, pois, menos uma tradição a seguir do que uma tradição a criar; terá uma forma própria a assumir e não um modelo rígido a limitá-lo". A validade da representação pela via do associativismo era justificada pelo facto de as associações serem "a estrutura organizacional e os centros de vida das comunidades portuguesas do estrangeiro".
Quando Fernanda Agria se preparava para dar sequência à ordem do dia do plenário, ouviu-se a primeira voz contestatária, prenúncio da partidarização, que viria da Europa e, sobretudo de Paris, marcando os plenários do CCP e dando da instituição uma imagem pública de conflitualidade, só parcialmente verdadeira
É assim que "O Diário" , afeto ao PCP, relata o incidente para a posteridade:
"Mal a Secretária de Estado da Emigração e Comunidades Portuguesas, Manuela Aguiar, terminou o seu discurso de saudação e de votos de bom trabalho, o delegado da Comissão da Comunidade Portuguesa de França, Carlos Duarte Morais, levantou-se e perguntou: Qual é a nossa participação nesta sessão inaugural?
Fernanda Agria comunicou-lhe que ele ficava inscrito para falar, o que só se verificou às 11.50. Entretanto os presentes ouviram as exposições de seis funcionários da SEECP, que os informaram sobre o âmbito de competência dos respetivos departamento"
Com o sub título "Protesto", o Diário continua a reportagem, escrevendo:
"O representante da CCP de França disse estar ali para protestar contra o facto de isto tudo estar preparado para nós sermos figurantes, constatou a ausência de Manuela Aguiar, exatamente quando falava o primeiro emigrante e comentou o teor das intervenções dos seis altos funcionários"
AS SESSÕES DE TRABALHO
Embora a lei fosse omissa quanto ao modo de funcionamento do CCP, o programa que foi delineado para a primeira reunião previa a alternacia de reuniões plenárias e de reuniões por secções. Concretamente seis: Educação e Ensino, Segurança Social, Regresso e Reinserção, :Comunicação Social, Revisão do DL 373/80 e Secção Especial (temas livres).
À semelhança do que acontece na Assembleia da República, também no Conselho, pelas mesmas razões, o Plenário foi o grande palco mediático do confronto de posições e as secções (como, em regra, as Comissões Parlamentares), que decorriam à porta fechada, converteram-se no espaço privilegiado de debate, de colaboração e de entendimento, nem sempre fácil, mas sempre conseguido. A prová-lo, ficaram 102 recomendações aprovadas consensualmente. Para isso muito contribuíram , também os especialistas, funcionárioas e funcionários dos diversos departamentos da administração pública, que mereceram a simpatia e o elogio unânime dos participantes. Eles e elas. Na verdade, alguns nomes femininos ficam ligados à história do 1º CCP, apesar da total ausência de mulheres entre os membros eleitos, os observadores da Comunicação Social, os parlamentares, os representantes das Regiões Autónomas, e, ao que julgo, também os parceiros sociais presentes (nomeados por indicação das respetivas corporações)
A presidência do CCP coube a uma mulher, por inerência, na qualidade de membro do Governo. coisa que nunca acontecera no Conséil Supérieur francês, cujos presidentes haviam sido sempre homens, Ministros dos Negócios Estrangeiros, que delegavam em Embaixadores.
A nota do equilíbrio de género,foi introduzida nas nomeações da Secretária-geral, Fernanda Agria, e de peritas para exercerem funções importantes de moderação e assessoria nas secções..
Foram moderadoras:
Maria Beatriz Rocha Trindade (Secção da Educação e Ensino e Secção Especial - 2ª geração e identidade cultural) e Rita Gomes (Secção Regresso e Reinserção)
Prestaram colaboração como assessoras:
Alexandra Lencastre da Rocha (Secção Especial): Maria Helena Lúcio (Selgurança Social e Secção Especial) e Maria Manuela Machado Silva (Ensino e Educação)..
Foi, assim, graças a um espírito de diálogo e de compromisso, que predominou no relacionamento humano dentro do círculo que constituiu cada secção, com os
onselheiros e os seus colaboradoes, mulheres e homens de reconhecida competência e ética de serviço público que o Conselho pode deixar uma panorâmica da emigraçãoportuguesa num significativo acervo de recomendações: cada recomendação é um conselho, coletivamente o Conselho em ato.
AS RECOMENDAÇÕES
Boa parte das recomendações programáticas, algumas delas vagas ou mera enunciação de problemas. mas outras houve que apontavam para soluções inovadoras, que vieram a inspirar políticas com concretização no imediato ou a prazo. Destacarei entre as propostas mais importantes:
ENSINO: a criação de Institutos de Língua Portuguesa: integração do português nos "curricula" escolares dos países de imigração;recrutamento, sempre que possível, de professores oriundos das cpomunidades: organização de cursos de férias e intercâmbios (que a própria SEECP levou, efetivamente e cabo), cursos de formação para professores de português no estrangeiro (eram já então e continuaram a sê-lo, por exemplo , na Universidade de Aveiro
SEGURANÇA SOCIAL:a tónica foi posta na negociação de acordos bilaterais, na melhoria das prestações a nível interno, no alargamentodo regime de inscrição voluntária de emigrantes segurança social portuguesa, que fora instituído no ano anterior(Decretto Regulamentar 7/80 de 3 de abril) .e "de jure constituendo" numa medida ambiciosa, nunca correspondida; a criação de uma "Caixa de Reforma dos Emigrantes"
RETORNO E REINSERÇÃO. o aumento das isenções alfandegárias (que, aliás, fez parte de um conjunto de medidas financeiras bastante eficazes adotadas logo depois da revolução de 1974, para incentivar o regresso), canalização, pelo sistema bancário,das remessas para polos de desenvolvimento regional (o que ficou sempre muito a desejar...),e a instituição de um Fundo de Solidariedade para os regressados (que ficou no plano da utopia, sendo certo, também, ao contrário do dramático retorno em massa de África, o regresso da Europa foi, em regra, bem planeado, individualmente).
COMUNICAÇÃO SOCIAL: as reivindicações apresentadas pelos profissionais dos media que compunham esta secção, com o estatuto de "observadores" ( ) tiveram, regra geral, um carater preciso e pragmático, e muitas delas ajudaram enormemente a articular e potenciar os parcos meios existentes, caso da realização de programas de apoio a rádios das comunidades (a RDP foi sempre um parceiro ideal, particularmente colaborante e eficiente), do fluxo de noticiários da ANOP (que a SEECP passou a assegurar, para os terminais de telex dos próprios media ou dos consulados), o aproveitamento dos programas de televisão, desde 74/75, elaborados para os emigrantes de França e Alemanha, estendendo o seu envio para canais ou emissões de televisão das comunidades em outros continentes (o que foi, dificilmente -mas foi! -, negociado com a RTP), o porte pago, e até a realização de um Encontro Mundial dos Órgãos de Comunicação Social das comunidades, prontamente agendadano ano seguinte.
SECÇÂO ESPECIAL - TEMAS LIVRES
Esta secção incluiu, como se esperava, assuntos muito diversificados, desde a reclamação da dupla cidadania (acolhida na ordem jurídica poucos meses depois), do voto na eleição presidencial (admitido na Constituição da República 16 anos mais tarde), do alargamento do número de deputados da emigração (ainda não aceite atualmente), até aos problemas específicos da 2ª geração, à necessidade de reforço dos serviços da SEECP, com o aumento de delegações no estrangeiro ou de balcões de apoio aos emigrantes nos aeroportos (o que foi, de facto, implementado) à revisão da Lei do Inquilinato, com a possibilidade de arrendamentos de curto prazo e atendendo, equitativamente, aos interesses dos senhorios e dos arrendatários.(matéria ainda agora muito atual) m aos transportes aéreos (mais rotas, melhores tarifas,,,) à adesão à CEE (à distância de 4 anos, já se falava de informação, dada em conjunto com os países de imigração e essa sugestão não foi esquecida, tornando Portugal o único país a ter uma iniciativa que teve a maior recetividade nos parceiros no eixo bilateral).
REVISÃO DO DL 373/80
A revisão da lei, e o esforça de repensar o CCP, a adequação das suas estruturas aos objetivos ambiciosos do seu papel representativo, estiveram no centro das atenções da 1ª reunião - foi a secção que atraiu os juristas, os estrategas, os "líderes dos líderes" do movimento associativo, a presidente do CCP. Nos corredores, na conversa informal, era chamada muito justamente a "secção política" - política no sentido nobre da palavra. Os consensos alcançados nesta sede foram os que verdadeiramente fizeram do CCP uma causa comum a todos, porque todos o julgavam um instrumento válido para expressão de projetos futuros Ou seja, mesmo os mais céticos, acabaram por reconhecer que não haviam sido chamados a Lisboa para serem apenas meros "figurantes".
O CCP tal como o queriam manteria o caráter consultivo. Seria composto apenas por membros eleitos, com possibilidade de eleições diretas, fora do mundo associativo. a t´titulo individual. Elegeria o seu presidente de entre emigrantes ou ex-emigrantes residentes em Portugal. Designaria o Secretário-Geral, embora este continuasse a ser apoiado pelos serviços da SEECP e poderia convidar para a reunião os membros natos e nomeados previstos na lei em vigor
Notas
(1) Para além da França, com a UFE, da Suiça com a "Organização dos Suiços no Estrangeiro" (da qual é oriundo o "Conselho"), também, por exemplo, a Austria Associação Mundial dos Austríacos no Estrangeiro,)a Bélgica ("Flamengos no Mundo" e "Union Francophone des Belges à l' Etranger"), a Alemanha (Associação para a Cultura Alemã no Estrangeiro, fundada em Berlim, em 1881, com o nome de "Associação Geral das Escolas Alemãs"), a Espanha (Fundação dos Espanhois no mundo), a Inglaterra ("Associação para os Direitos dos Ingleses no Estrangeiro"), a Itália ("Sociedade Dante Alighieri, a "União dos Italianos do Estrangeiro" e organizações regionais como "A família Veneziana! e "A Família Milanesa), a Polánia (com "Comunidade Polaca", em 1990), a Suécia (com duas associações internacionais "A Suécia no Mundo" e a "Associação Educativa das Mulheres Suecas") vd sobre estas formas de organização o relatório de M Bohm "Os Europeus residentes no Estrangeiro" Assembleia Parlamentar do Conselho da Europa, 1993
(2) Uma das explicações para a não existência de um movimento internacional da Diáspora portuguesa poderá ser o facto de o destino largamente predominante da emigração ter sido o Brasil. É ao nível deste país quase continental que encontramos o primeiro grande movimento federativo , com aa Federação das Associações Portuguesas e Luso- Brasileiras. A única tentativa de criação de uma rede mundial deve-se à Sociedade de Geografia, na presidência de Adriano Moreira nos anos 60: a "União das Comunidades de Cultura Portuguesa, que foi instituída durante o 1º Congresso das Comunidades de Cultura Portuguesa, em Lisboa, e organizou, de novo com a presidência de Adriano Moreira, o 2º Congresso, em Moçambique. O 3º Congresso, que iria realizar-se no Brasil, deparou com obstáculos levantados pelo governo de Marcelo Caetano. Foi adiado "sine die" e assim se perdeu a possibilidade de implementar uma União ainda em fase embrionária - não porque precisasse de apoio oficial para avançar, mas porque não tinha a liberdade para o fazer...
(3) O Prof Emygdio da Silva ,já no início do século, rejeitando, embora, a ideia do voto nacional dos emigrantes, apontava para a representação dos emigrantes num órgão próprio. Um verdadeiro percursor, no plano puramente teórico
(4) Os candidatos às eleições deviam ser, obrigatoriamente, membros de uma associação do estrangeiro e ter nacionalidade francesa
(5) Jöelle Garriaud Mayland, Conselheira e Senadora pelos franceses do estrangeiro e autora de uma publicação sobre a "Assemblée des Français de l' Ètranger" , ao historiar o percurso do "Conselho", destaca o seu papel no domínio do ensino, da proteção social e pensões, na aceitação da dupla nacionalidade e do lado menos positivo, refere a pouca notoriedade de que goza, apesar da sua importância, esta instituição, quer dentro de França, quer também entre os expatriados
(6) O Programa Eleitoral da AD, no capítulo da Política Externa (página 56, )distinguia políticas para a "Emigração" (medidas de proteção aos emigrantes e seus descendentes, acento no ensino, na cidadania, nos direitos de participação política, na facilitação do regresso), e para as "Comunidades Portuguesas no Mundo", como realidade que exigia meios próprios, gestos de aproximação das comunidades da Diáspora. Nos seguintes termos: "Para além dos núcleos de emigração antigos e recentes, existem espalhadas pelo mundo numerosas comunidades portuguesas ou de descendentes de portugueses cujo significado histórico, cultural e patriótico se impõe reconhecer e preservar. Essas comunidades não devem constituir objeto de manipulação partidária, nem mesmo de submissão ao enquadramento ou ao controlo do Estado [...] Assim, o Governo da Aliança Democrática criará um Conselho das Comunidades Portuguesas no Mundo, onde estas se poderão fazer representar e conceder-lhes-á apoio constante e permanente
(7) Os congressos da década de 60 não se enquadravam, de todo, nessa perpetiva, antes poderão ser considerados como precursores da CPLP e assim os via o maior impulsionador desta comunidade, Embaixador José Aparecido de Oliveira - têm já feição "pós-colonial", são prelúdio de uma época em que a expansão cultural se joga, sobretudo, na língua, nas Diásporas lusófonas, na partilha de raízes e afetos.
(8) Não se exigia aos conselheiros o vínculo da nacionalidade, nem sequer o de ascendência portuguesa, apenas o sentimento de pertença, que se comprova pela participação ativa e relevante no mundo do associativismo lusófilo. Outra afloração desta originalidade nossa é a forma de cálculo das comunidades para efeito de representação quantitativa: as comunidades antigas, partindo das estimativas consulares, contam a dobrar. Eis o que o singularizava face ao modelo françês ( e aos que posteriormente surgiram na Europa)
.(9)O Prof. Adriano Moreira, que conheci, através do Deputado José Gama, foi a primeira das personalidades ouvidas. Os três conversámos longas horas, em encontros informais, sobre os grande congressos da década de 60. Pena foi que não tenhamos podido dar sequência ao seu projeto. O próprio CCP, como disse, não quis dar prioridade à vertente cultural e não tivemos meios para desdobrar o Conselho dos Emigrantes e o Conselho da Diáspora. Há agora um grupo que se chama precisamente "Conselho da Diáspora", e que reune, de vez em quando, com o Presidente da República, mas sem agenda nem estartégia conhecida. O nome já existe. Pode ser que um novo Presidente lhe consiga dar corpo e alma...
A propósito de encontros sob a égide presidencial, é de referir que estava previsto, em 1980, a coincidir com a celebração da passagem dos 400 anos sobre a morte de Camões:" 1º Congresso das Comunidades Portuguesas". Decorriam já as suas reuniões preparatórias, dentro e fora do país. O diploma que regulamentava o Congresso apontava para uma futura estrutura permanente de ligação entre os emigrantes, que deveria sair de propostas dos participantes. Porém, o Governo, ao mais alto nível, decidiu adiar o Congresso para junho do ano seguinte, avançando com a constituição do CCP, como órgão consultivo da emigração. Como Secretária de Estado cumpri, convicta e diligentemente, o plano governamental, suspendendo, de imediato, os trabalhos preparatórios do Congresso e ultimando os do diploma do CCP. Em resposta ao adiamento "unilateral" do Congresso pelo Governo , o Presidente, como era de esperar, reteve o diploma do CCP durante meses (com um "veto de bolso", como correntemente se dizia). A promulgação em setembro determinou o adiamento da 1ª reunião do Conselho,. Tanto este como o Congresso se realizaram, pois, em 1981 (em abril e junho, sucessivamente), gerando, como era previsível, na opinião pública e nas comunidades, uma certa confusão entre a sua natureza e objetivos. Nas comunidades repercutiu, inevitavelmente, este ambiente de dissenso e animosidade política. Ainda por cima, não houve a devida articulação entre as organizações do CCP e do Congresso, apesar da organização dese ter transitado para a órbita do governo, que livremente nomeou o seu presidente. Todavia, a unidade e o dinamismo da AD no VI Governo estavam, a meu ver, irremediavelmente perdidas com a morte de Sá Carneiro e este caso foi apenas mais uma consequência dessa fatalidade..
O Congresso foi do domínio do efémero, um" happening" irrepetível, marcada pela conflitualidade, logo na sessão solene de inauguração, e prejudicado, nas sessões de trabalho, pelo rateio de tempo de palavra, que a muitos intervenientes não permitiu mais do que breves palavras de saudação -ou de contestação. Mais interessante terão sido, certamente, as reuniões preparatórias nos vários continentes, cujas atas se encontram publicadas.
(10) Do Conselho francês sabíamos que os 45 eleitos (em 1950) ocupavam um lugar central e coexistiam bem com os não eleitos. Quanto ao Conselho suíço (que não foi considerado como modelo por ser uma organização privada) porocura, pelas mesmas razões de eficácia, construir pontes, redes de apoios e alianças, chamando a si pessoas e entidades do interior do país e elege, em regra, para presidir ao Conselho, uma personalidade residente no país.
(11) Será difícil fazer a história do que aconteceu localmente. Obrigará a recorrer à imprensa local, aos arquivos consulares, correspondência de e com a SECP - que, de facto, não teve interferência no processo. Da imprensa, referirei um recorte de jornal em que se relata um encontro realizado com os eleitos, a pedido deles, durante uma visita, a Paris, que seria, ao longo do percurso do 1º CCP, o epicentro de todas as discórdias. Curiosamente, a principal reivindicação era o pagamento de salários perdidos nos dias de reunião. Muito "terra a terra"...Mas era razoável. Foi prometido logo ali, e cumprido, depois, sem burocracias de maior, mediante uma declaração do requerente.
Mais complicado de resolver foi a decisão da Embaixada de Bona de excluir da inscrição no colégio eleitoral as associações ligadas à Igreja, contra a interpretação geral dada ao conceito de associação em todos os outros países. Foi preciso consagrar expressamente na lei a não discriminação das instituições ligadas a qualquer credo religioso, para que Bona aceitasse as determinações de Lisboa...
(12) Não fica claro, embora, pensando um pouco, se possa deduzir, que a Secretária de Estado se ausentou, numa parte do programa em que estavam previstas as informações técnicas dos funcionários... Em todo o caso, na parte final do artigo há breves citações de outros conselheiros, da emigração transoceânica, dissonantes das posições do orador de França. Só um vê escrito o seu nome: Carlos de Sousa (Venezuela), que "fez um apelo à união de todos os emigrantes e disse que considerava o decreto -lei que institui o Conselho como uma "certidão de nascimento" e como tal devia ser encarado" . Ficámos sem saber qual seria o delegado do Ontário, Canadá, que "comentou em termos fortemente críticos as intervenções dos representantes dos emigrantes de França, RFA e da CGTP-IN. Esta intervenção, mais própria de um representante governamental, causou a estranheza e os protestos dos visados (...).
Não obstante o seu cariz partidário, a narrativa é elucidativa do ambiente em que decorreram os debates no "dia um" do CCP: a contestação ensaiada pela Comissão de França, a divisão entre a Europa e todos os outros continentes, que viam o Conselho proposto pelo governo como positivo, divisão à qual subjazia a tentativa de politização comandada pelo bloco de França contra as comunidades transoceânical.
Os títulos da imprensa, a 7 de abril são, também, tudo menos consonantes, em função da tendência polític de cada um
O Diário (comunista): "Tudo preparado para sermos figurantes"
Portugal Hoje (socialista): "Trabalhos abrem com polémica"
Diário de Lisboa (socialista) "Emigrantes exigem um papel ativo e recusam o lugar de "figurantes"
Nos media mais próximos da AD, ou menos hostis, o tom é de neutralidade. a notícia é a reunião:
JN: "Houve pouca abertura de alguns setores" - lamenta Manuela Aguiar (crítica que se referia à dificuldadae de aumentar a representação política dos emigrantes).
A Tribuna: "Conselho das Comunidades teve ontem início"
Correio da Manhã: "Conselho das Comunidades reuniu pela primeira vez"
Comércio do Porto; "Conselho reunido até 6ª feira Congresso das comunidades já em fase de preparação"(estava estabelecida a confusão entre Conselho e Congresso das comunidades).
A Tarde: "Conselho das Comunidades reuniu esta manhã" (6 de abril)

dezembro 07, 2015



Entre 2005 e 2009, a Dr.ª Maria Barroso foi a Presidente de Honra dos Encontros para a Cidadania - a Igualdade entre Homens e Mulheres, uma iniciativa inédita, em Portugal - e, ao que julgamos, única em países de emigração - destinada a levar às comunidades portuguesas da Diáspora um forte apelo à participação de todos na afirmaçâo dos valores de género e geração, na vivência da democracia e na valorização de uma cultura universalista, como é a nossa,
Foi verdadeiramente um "correr mundo" para a Dr.ª Maria Barroso e para um conjunto de personalidades que a acompanhava, e que incluía, para além de membros do Governo, representantes de organizações da "sociedade civil", unidos e motivados pela mesma causa, a de aprofundar a consciência das discriminações que subsistem e assumem contornos específicos no quadro das migrações, assim promovendo a inclusão dos grupos mais marginalizados da sociedade, através do exercício concreto e efectivo dos seus direitos e dos seus talentos.
Há muitos anos que admirava a Dr.ª Maria Barroso e que com ela tinha colaborado, sobretudo nestes domínios dos direitos humanos, dos direitos das mulheres, em colóquios e congressos da Associação de Estudos Mulher Migrante, onde sempre foi uma presença influente e mobilizadora. Contudo, nunca tinha partilhado com ela longas viagens através dos oceanos (um tempo que, em conversa, ouvindo-a, passava célere), e a intensidade do dia a dia feito de debates vivos e memoráveis, de convívio em que os temas dos encontros se continuavam, incessantes, nas pausas, nos almoços e jantares, com que as nossas comunidades gostam de acolher os visitantes... Nunca tinha podido sentir tão de perto a profunda afectividade que desperta a Dr.ª Maria Barroso em todos quantos escutavam as suas palavras brilhantes, na substância e na forma como as diz, com a marca da convicção e da autenticidade, e com a simplicidade natural, com que se torna tão próxima (“uma de nós”, sem que nunca esqueçamos a sua absoluta excepcionalidade!).
Esses Encontros faziam História, como reconhecíamos já então, porque significavam o princípio da aplicação das políticas da igualdade de género em Portugal, no seu inteiro espaço humano, para além das fronteiras territoriais, e também porque eram encabeçados por um autêntico expoente das qualidades e capacidades da Mulher Portuguesa. Para as emigrantes, um exemplo vivo de como ser Mulher e Cidadã, que estava ali a seu lado, tão acessível e solidária. Para os convidados de um País estrangeiro, uma singular mensageira de Portugal, da sua verdadeira dimensão cultural e política.
O primeiro de seis encontros foi o da América do Sul, realizado em Buenos Aires, seguindo-se o da Europa, em Estocolmo, os da América do Norte, no leste do Canadá, em Toronto e no ocidente dos EUA, em Berkeley, o da Africa em Joanesburgo e, por último, o “encontro dos encontros”, um congresso internacional no nosso País. Sobre cada um deles se poderia escrever uma longa crónica – longa e feliz. Aqui fica apenas um breve e objectivo registo de factos, que se espera sejam, de qualquer modo, sugestivos do ambiente vivido, das esperanças despertadas, do impacte que se prolonga até hoje, em novas iniciativas, deixando-nos a convicção de que há um período antes e depois deste encadeamento de congressos, no que respeita à política de Estado para as comunidades, que passou a incorporar, esperamos que definitivamente, uma componente de género.
O ENCONTRO NA AMÉRICA DO SUL
Buenos Aires, 16 e 17 de Novembro de 2005
Biblioteca Nacional, Salão Jorge Luís Borges
Organização local da Embaixada de Portugal e da Associação Mulher Migrante Portuguesa da Argentina.

Sob a égide do grande escritor argentino, que, por ascendência e por afecto, é também nosso, com a presença simbólica de Maria Kodama, a viúva de Borges, num auditório repleto de ilustres participantes portugueses e argentinos, com jornalistas dos principais media nacionais - imprensa, rádio, RTP - se reiniciou uma caminhada histórica, que tivera o seu começo precisamente 20 anos antes, no 1º Encontro Mundial de Portuguesas no Associativismo e no Jornalismo, convocado durante o Governo de Mário Soares. O Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas António Braga propunha-se, como asseverou publicamente, retomar uma questão que andava esquecida pelos governos nas suas políticas de emigração há muitos anos.
Aí, em Buenos Aires (capital de um País onde a Mulher já ascendera à presidência da República, e onde uma Portuguesa - Regina Pacceli - fora a única Primeira Dama estrangeira), partilhando a mesa de honra com António Braga, com o Embaixador Almeida Ribeiro e comigo mesma, a Dr.ª Maria Barroso proferiu a conferência de abertura - dando-nos uma perspectiva diacrónica sobre a luta das mulheres pela plenitude dos direitos de cidadania e convidando-nos a participar na aventura de equacionar e de construir o seu futuro.
Depois de dois dias de debates e da aprovação das conclusões, que são um notável documento sobre as matérias em análise, a Presidente Maria Barroso, como que sintetizando as conclusões, diria: "Considero que foi uma reflexão aprofundada sobre os problemas que dizem respeito às mulheres, e, em particular, às mulheres migrantes. Mulheres e Homens têm de assumir um papel onde ambos os géneros contribuem para a melhoria da sociedade".
As comemorações da Associação Mulher Migrante constituíram, logo depois, a parte festiva destas jornadas de trabalho. E, como são sempre celebradas em ambiente de grande entusiasmo e confraternização inter-associativa, e "paritária" (com os líderes das maiores instituições envolvidos na homenagem aos méritos e realizações da primeira associação feminina da comunidade), foram mais um meio de alargar a reflexão sobre as questões da cidadania, dos direitos e deveres em que esta se expressa, do novo papel das mulheres.

O ENCONTRO NA EUROPA
Estocolmo, Museu Etnográfico, Março de 2006
Organização local da PYCO, Federação Internacional de Mulheres Lusófonas

Presente ao lado da Dr.ª Maria Barroso e do Embaixador de Portugal, a antiga Ministra, Comissária Europeia e Presidente da Internacional Socialista de Mulheres, Anita Gradin, que foi uma próxima e importante colaboradora de Olaf Palme e uma pioneira, grande impulsionadora da "praxis" da paridade na Suécia, primeiramente no seu próprio partido. Entre ambas, como entre todas nós, na organização dos trabalhos, e entre nós e o Secretário de Estado da Presidência do Conselho de Ministros, Jorge Lacão, representando o Governo, havia uma evidente sintonia de posições. E, tal como na Argentina, foi ampla a participação de personalidades e de ONG's do país que nos acolhia, a permitir a troca de experiências e ensinamentos. A imprensa nacional e regional esteve presente e deu notícia das propostas deste novo congresso.
"É muito importante que os homens estejam presentes, não queremos uma sociedade de mulheres, mas antes de homens e mulheres conscientes dos seus direitos e deveres", salientou a Dr.ª Maria Barroso.
Este ênfase na ideia da cidadania feminina para o serviço da comunidade, na linha de pensamento das feministas da 1ª República, leva-nos a vê-la, nos ideais, como na acção concreta pela liberdade e democracia, como uma genuína herdeira dessa plêiade de notáveis Portuguesas do começo de novecentos.

O ENCONTRO NA AMÉRICA DO NORTE
"Conferência para a Participação Cívica e Política"
Toronto Março de 2007 Auditório do "Metro Hall"
Organização Local: Consulado Geral de Portugal, e um elevado número de ONG´s luso-canadianas e canadianas.
Patrocínio da Região Autónoma dos Açores
A conferência reuniu muitos membros de associações, universitários e investigadores, deputadas canadianas, e activistas dos direitos humanos, mulheres e homens, e teve uma cobertura excepcional de todos os media em língua portuguesa de Toronto ( muitos e muito bons), que, de uma forma unânime, saudaram aquela realização e deram a medida do seu relevo, contribuindo para que as temáticas desenvolvidas e o essencial de uma mensagem tão clara e forte chegasse à comunidade inteira.
O Secretário de Estado Jorge Lacão, esteve, naturalmente, nos momentos protocolares de abertura e encerramento, mas também participou activamente nos trabalhos de todos os painéis, Aí divulgou o Plano Nacional para a Igualdade e a extensão da Lei da Paridade às eleições do Conselho das Comunidades Portuguesas (que viriam a ser as primeiras a que as novas regras se aplicaram). O Embaixador Silveira de Carvalho e o Dr. Álamo de Oliveira em representação dos Açores foram também brilhantes intervenientes. E a Cônsul-Geral Maria Amélia Paiva foi unanimemente elogiada pela organização da" Conferência", e, mais globalmente, pelo desempenho à frente do Consulado, onde foi a primeira mulher a exercer o cargo.
A Dr.ª Maria Barroso, partilhou do entusiasmo geral, falando da abertura de horizontes ("A Mulher de hoje pode governar uma Nação"), não deixou, todavia, de denunciar, em contra corrente, muitas discriminações que subsistem: "Temos muito que lutar para que a igualdade entre homens e mulheres seja uma realidade, mas tenho a certeza de que um dia venceremos. Já não será para mim, mas para aquelas que nos darão continuidade".
Para além da Conferência, houve ainda ocasião para corresponder a convites da comunidade, do Museu dos Pioneiros e da Associação de Apoio a Deficientes Portugueses, onde a Dr.ª Maria Barroso e eu recebemos o título de Presidentes de Honra.
Recém inaugurada esta grandiosa obra de solidariedade, converteu-se já um "ex-libris" da nossa Comunidade, tornou-se centro de apoio e, também, de animação cultural e de valorização humana dos mais velhos e dos mais marginalizados.
Na despedida de Toronto fica a frase de Jorge Lacão, que a imprensa reproduziu amplamente: "Viemos ver coisas extraordinárias."
O articulista do" Pós milénio" foi um dos que sintetizou bem o espírito destas iniciativas: "Um encontro para a cidadania tem que se lhe diga. É bem capaz de cavar alicerces que nem sempre foram abertos para todos (...) de trazer à discussão temas do maior interesse, que levam a harmonia a uma sociedade, por vezes pouco lógica e racional".
É de assinalar ainda, fora de Toronto, uma deslocação breve da Dr.ª Maria Barroso a Montreal para um outro encontro, a celebrar o Dia Internacional da Mulher - uma iniciativa que o jornal Luso Presse promove todos os anos. Com a presença do Cônsul Geral Dr. Carlos Oliveira e da Ministra da Imigração do Québec, de várias deputadas e de uma vereadora portuguesa, de uma sala cheia de portugueses, viveram-se momentos irrepetíveis de emoção até às lágrimas, com a Dr.ª Maria Barroso a receber uma infindável ovação, no fim de uma memorável mensagem sobre a história e o futuro da nossa democracia.

ENCONTRO EM ÁFRICA
Joanesburgo, Março de 2008
Sala de Conferência do "Lusito", Associação em favor de Crianças Deficientes
Organização Local: Liga da Mulher Portuguesa na África do Sul. Patrocínio da Região Autónoma da Madeira e do Consulado Geral de Portugal

Nas esplêndidas instalações do "Lusito", para uma audiência onde predominavam as mulheres, mas onde estavam também o Embaixador Paulo Barbosa, o Cônsul-Geral Manuel Gomes Samuel e os dirigentes das principais instituições comunidade, a Dr.ª Maria Barroso falou da situação das mulheres através dos tempos e no nosso tempo e lembrou-nos que "apesar da História ter sido tecida por Mulheres e Homens só a estes é dada relevância" - e esta é justamente uma das injustiças a que o exercício da cidadania no feminino procura por fim.
A oradora focou muito em especial a participação das Portuguesas na luta pela democracia e a importância que isso e outros factores, como a grande guerra mundial e a guerra colonial, tiveram na ascensão das mulheres e abordou preocupações e uma nova agenda de temáticas em que as mulheres podem fazer a diferença - a denúncia da violência nos media, o racismo e a xenofobia, a indiferença perante tantos atropelos dos direitos humanos, a exclusão social, os maus tratos a crianças, a violência doméstica.
O Encontro ganhou uma dinâmica original, a marca do modo de funcionamento da "Liga da Mulher", com a organização de quatro "workshops" sobre: a situação das mulheres portuguesas na Àfrica do Sul e o seu diálogo e colaboração com as naturais do País; os diferentes processos de afirmação das Portuguesas na Diáspora e no nosso País; os principais domínios em que se reconhece perdurarem discriminações; o ensino do português a da nossa cultura na África austral.

Na sessão de encerramento, o SECP António Braga manifestou o seu inteiro apoio ao movimento de mudança que ali se confirmara e anunciou a realização em 2009 de um Encontro Mundial de Mulheres em Portugal.
A missão na RAS, como, aliás, as anteriores, traduziu-se na discussão de ideias e no traçar de metas para trabalho futuro, mas também na criação de laços de amizade que facilitarão a cooperação para a sua prossecução concreta.
E houve tempo para a nostalgia, para a Dr.ª Maria Barroso lembrar que ali estivera a acompanhar o seu filho, salvo pelo empenho e qualidade da medicina sul-africana, depois de um acidente quase fatal. Ou para recordar um prévio encontro com o Dr. Paulo Barbosa, então Embaixador em Israel, durante uma visita presidencial, que coincidiu com a trágica morte de Itzak Rabin, um grande amigo do Presidente Mário Soares e da Dr.ª Maria Barroso. Pedaços da história à qual a antiga fundadadora do PS, Deputada e Primeira-Dama, pertence para sempre.

ENCONTRO NA AMÉRICA DO NORTE Califórnia
Berkeley, Universidade da Califórnia
Maude Fife Room, Wheeler Hall
25 de Setembro de 2008
Organização Local: Profa. Deolinda Adão, (Universidade de Berkeley) e Cônsul Geral de Portugal, Dr. António Alves de Carvalho
A nível da coordenação nacional, foi directamente a Fundação Pro Dignitate e não a AEMM que assumiu o papel operacional de coordenação, a cargo do Dr António Pacheco, actualmente o Secretário-geral da "Fundação"
A caminho da costa oeste, uma breve estada em Elizabeth, NJ, a convite de Monsenhor João Antão, e da paróquia portuguesa de Nossa Senhora de Fátima, em cujos salões se realizou um primeiro encontro de formação de jornalistas lusófonos, centrado nas temáticas da Paz e da Igualdade.
Com Monsenhor Antão, um verdadeiro líder espiritual da comunidade, de quem a Dr.ª Maria Barroso diria tratar-se de "uma personalidade de excepção", visitamos a escola que tem o seu nome. (uma honra num país onde é raríssimo atribuir a instituições públicas o nome de pessoas vivas). Um Liceu muito prestigiado, com vocação para as artes e a música, onde jovens americanos cantaram o nosso hino nacional na perfeição. Difícil foi conter a emoção...
Berkeley recebeu o Encontro sobre "O papel da Mulher no futuro do associativismo e movimentos cívicos da Califórnia", pondo o enfoque nas questões do associativismo feminino, (com uma admirável introdução da Profª Adão), e da colaboração intergeracional assim como do papel dos media na formação para a igualdade.
No encerramento, o SECP António Braga e a Presidente Maria Barroso deixaram a certeza de que as soluções ali propostas não seriam esquecidas.
Ao abordar, tanto em Berkeley como em Elizabeth, o tema da interculturalidade entre comunidades migrantes de diferentes países que se expressam em Português, Maria Barroso, mostrava acreditar (e todos nisso a secundávamos) que, também neste domínio, o entendimento entre as mulheres migrantes dos vários quadrantes da lusofonia pode fazer a diferença (1).
Seguiu-se um encontro mais restrito no departamento de Estudos Europeus, com bolseiros portugueses que naquela tão conceituada universidade preparam doutoramento em diversos domínios.
Antes do regresso a Portugal, nova passagem por Elizabeth, onde Monsenhor João nos preparara uma surpresa, uma singular tributo à Dr.ª Maria Barroso, no termo de um longo périplo por tantas comunidades: naqueles poucos dias da nossa ausência na Califórnia, o talentoso artista Roger Gonzalez (a quem se devem as obras primas de arte sacra da Igreja de Nossa Senhora de Fátima) pintara um esplêndido retrato da Dr.ª Maria Barroso, à entrada da ala da residência onde estivera hospedada!
Ao findar um périplo por tantas comunidades, reavivando a importância histórica do "congressismo" na luta pela igualdade das mulheres, readaptada aos tempos de hoje, a Presidente dos Encontros deixava assim simbolicamente o seu retrato num mural na América do Norte, tal como deixara, por todo o lado, o retrato de corpo inteiro de uma cidadã, capaz de mobilizar pela palavra e pelo exemplo para a mudança em sociedades cada vez mais abertas a todos os seres humanos, mais livres e democráticas.

Em Espinho, em Março de 2009, num último Encontro internacional, com a presença das responsáveis pela organização de todos os que ocorreram na Diáspora, e a presidência da Dr.ª Maria Barroso um ciclo se encerrou, na esperança de que o projecto de mobilização para a cidadania iria prosseguir na rede de solidariedades que ficou criada, e em gestos concretos de vivência da cidadania que as mulheres aprenderam umas com as outras. Esperança bem fundada, que hoje podemos ver ínsita emnovas manifestações de mobilização para a igualdade

dezembro 01, 2015

EVOLUÇÃO DAS POLÍTICAS DE GÉNERO NA EMIGRAÇÃO PORTUGUESA

DA EXPANSÃO Á EMIGRAÇÃO

A Expansão - Uma Aventura no masculino

A Expansão portuguesa, que antecedeu infindáveis ciclos migratórios, foi uma aventura de homens. Sabemos que já no século XVI envolveu cerca de um terço da população total, que rondava um milhão (Serrão, 1977: 93), e que apenas um reduzido número de mulheres foi autorizado a partir para o norte de África (onde se vivia em clima de permanente insegurança), ou nas longas e perigosas viagens da carreira das Índias. Mesmo assim, algumas mulheres deixaram o seu nome nas crónicas sobre a defesa das praças norte africanas e dos domínios orientais, onde se distinguiram pela coragem (SILVA, 1989), qualidade que é, certamente, comum a ambos os sexos, mas que os cronistas louvavam sempre como "varonil"... Não são, porém, as heroínas, as exceções, que podem fazer, só por si, a história coletiva das mulheres (1), enquanto a metade da humanidade a quem queremos dar visibilidade, “vez e voz", como propugna o movimento que aqui, hoje, nos convoca a uma reflexão para mudar todo um estado de coisas.
Vamos, pois, olhar essa metade da humanidade, que as políticas de Estado, neste como em outros domínios, deixaram sistematicamente numa zona marginal ou penumbrosa
Podemos afirmar que a mais antiga e invariável caraterística das políticas de colonização e de emigração, no caso português, é a proibição geral da saída de mulheres, faceta misógina, em grau tal de extremismo, que só encontrará paralelo em culturas não europeias, com as quais, aliás, a nossa conviveu intimamente, antes e depois do princípio do êxodo sem fim dos Portugueses, à escala planetária.
As leis e as práticas em que se traduziu esta política discriminatória, sob uma capa do protecionismo, não suscitaram oposição pública, nem entre populares nem a nível de elites académicas ou políticas
Um historiador que muito se interessou pela abordagem desta matéria, CR Boxer, dedicou-lhe especial atenção numa série de palestras, publicadas em 1975, com o título original de "Mary and Misoginy" , que foram traduzidas para o português dois anos depois (curiosamente, sem qualquer menção a misogenia no cabeçalho).Nessa coletânea, (Boxer, 1977) não poupa críticas à situação das mulheres portuguesas, enclausuradas dentro de suas casas por pais ou maridos, tal como nas fronteiras do território por imposição estatal, em contraste com o que acontecia no resto da península, sob o mando Castela.  É certo que compara, sobretudo, a colonização castelhana das Américas com a nossa presença no Império do Oriente, e que o número e proporção de mulheres envolvidas no desenvolvimento do Brasil, em condições de vida mais semelhantes às do reino, são bastante superiores, como ele próprio não deixa de reconhecer.
Nem por isso a fundamental divergência política se atenua: a Coroa castelhana fomentava a colonização por famílias inteiras, a portuguesa cerceava a participação de mulheres portuguesas e baseava-se na miscigenação, através de casamento ou uniões de facto dos homens com companheiras nativas. Castela legislou, recorrentemente, sobre a obrigação de os homens chamarem as esposas para junto de si, ou regressarem ao Reino para fazerem "vida de casados". Preocupação humanista - ou feminista – omnipresente no plano de povoamento do Novo Mundo de fala castelhana, que servia, em simultâneo, outros obetivos essenciais, como o da expansão da língua e da cultura. Dimensão ausente nas políticas dos monarcas portugueses, aparentemente insensíveis face à sorte das mulheres, ou ao que hoje chamamos o direito à reunificação familiar, e, bem assim, à sua importância na transmissão dos valores da cultura nacional (2)
Exceções também as houve, inflexões desta orientação da Coroa, em nome dos seus interesses, que não no das mulheres - experiências intermitentes, sem carater sistemático, como o do envio para a Índia, e outras possessões, em viagens sem regresso, das “órfãs d’ El Rey, (Néry, 2012), jovens dadas em casamento a compatriotas a troco de um dote, terras de cultivo, emprego no funcionalismo público (3). O mesmo se diga do povoamento por casais, ensaiado, por exemplo, em Angola, no sul do Brasil ou nas ilhas atlânticas. (Boxer, 1977:78-84)
A extensão e relevância destas medidas no contexto global da colonização constitui matéria que está longe de ser pacífica. Inquestionável é a persistência, como regra geral, de uma política repressiva da expatriação das mulheres.

Emigração - A continuidade das políticas restritivas

Se na própria colonização promovida pelo Estado o papel das portuguesas foi subavaliado, não era de esperar que o fosse menos na fase de emigração, em sentido restrito, depois que passou a dirigir-se a um país estrangeiro - o Brasil que, após a independência, atraía as tradicionais correntes migratórias, em enorme e crescente proporção.
Com isso, ao longo dos tempos, desde o Século XVI, terão perdido todos, os portugueses e Portugal. Di-lo, com meridiana clareza, Lokchart, ao comparar os modelos de colonização peninsulares: […] grandes regiões da América espanhola tinham mulheres em número suficiente para permitir manter intactas a cultura e tradições ibéricas, ao contrário do que aconteceu em muitos estabelecimentos portugueses, onde elas eram poucas ou nenhumas, e onde a língua, a religião e a cultura dos portugueses se reduziram drasticamente (Boxer, 1977:37)
Foi, sem dúvida, o que aconteceu por todo o Oriente, onde se salvaram apenas alguns pequenos núcleos de lusofonia, que a fé cristã, a pertença religiosa e, através dela, os laços culturais e afetivos vêm mantendo até hoje (pensemos, por exemplo, em Malaca, onde o próprio falar, originário do português quinhentista, tomou a designação de “kristang” (Marbeck, 2004). Em muitas outras antigas possessões resta a memória, na pedra dos monumentos e, porventura, nos apelidos de um grande número de luso descendentes, que poderiam ser, e não são, parte da Diáspora (4)
O português manteve, como sabemos, o seu estatuto de “língua franca”, por quase um século, após o declínio do Império do Oriente. Mas isso mostra, justamente, que se tornara veículo de comunicação no mundo das transações comerciais, um reduto masculino…
A exclusão das mulheres de uma participação significativa nas andanças da exploração dos mares e das terras terá sido, antes de mais, fruto de uma visão tradicional do lugar da mulher na sociedade, em que a sua influência e o seu possível contributo na construção de sociedades inter culturais foram sub estimados.  Menor ainda era o papel que lhe atribuíam na emigração, vista apenas como meio de ganhos materiais, com total desvalorização da relevância social e cultural das comunidades nascidas de sucessivas vagas migratórias.
Mas as portuguesas partiram, sempre que foi preciso, contra leis extensivas aos dois sexos, contudo, com gradações de tolerância diversa (favorecendo, sempre a circulação de homens sós, com intenção de regresso). Esta era a forma de o Estado assegurar, durante todo o tempo de ausência, o envio de remessas para as famílias retidas em Portugal. O montante atingido por essas verbas – uma infinidade de pequenas poupanças que representavam grandes sacrifícios, a acrescer ao sofrimento da separação familiar dos dois lados do oceano – era de tal ordem, que delas dependia o equilíbrio da balança de pagamentos com o exterior.
A reunificação familiar significava o fim das remessas (divisas). E mais: pressentia-se que as mulheres subvertiam, perigosamente, o projeto migratório, no sentido do não retorno, contribuindo para o enraizamento em terra estrangeira. Um mal absoluto! Os académicos foram os primeiros a configurá-lo e a denuncia-lo nas sua obras científicas. Afonso Costa, por exemplo, escrevia que a abalada de mulheres era “uma depreciação do fenómeno migratório”. “…é quando a família fica na terra que ele envia mais regularmente as suas economias” (Costa, 1913:182). Emídio da Silva, por seu lado, afirmava que a nova tendência de saída maciça de mulheres era “uma constatação tremenda”, acentuando os perigos de “desnacionalização” e “cessação de remessas” (Silva:1917:132)) Fazedores de opinião, de políticas, numa avaliação puramente economicista das vantagens da emigração.
Porém, não houve discurso, nem lei ou autoridade que conseguisse estancar o êxodo, nem desviá-lo da rota brasileira para as colónias que restavam… Depois que o preço das viagens se tornou mais acessível, na primeira década do século passado, aumentou substancialmente, o número quer dos clandestinos, quer dos legais, que abandonavam o velho continente. As portuguesas, os filhos que as acompanhavam, constituíam, então, cerca de 30%, do total de saídas, um acréscimo de 107%, segundo o Prof. Emygdio da Silva, percentagem, que, ao longo do século, aumentou, progressivamente, atingindo a quase igualdade na emigração europeia, a partir de 1950/60.
Mesmo para destinos próximos, os homens iam à frente, mas os tempos eram outros, com o reagrupamento familiar a ser permitido, na Europa, em nome de direitos humanos fundamentais. E, quando a crise económica e mundial, a partir de 1973-74, quase fez cessar a emigração masculina, a feminina cresceu, ao abrigo daqueles princípios humanitários. Falava-se de “feminização da emigração”.
O “Estado Novo” abrandava a aplicação de regras restritivas, e, em1971, criava o Secretariado Nacional da Emigração (SNE) e, seguidamente, os primeiros serviços de apoio social no estrangeiro (Gomes, 2014:7). Contudo as mulheres, que se reuniam aos maridos, ficavam, em muitos países europeus, sujeitas a um estatuto jurídico de dependência, impedidas de aceder ao mercado de trabalho. Foi de uma forma gradual que venceram esses obstáculos e penetraram no mundo laboral. (Ramos, 2009:47) O trabalho salariado mudou o seu destino, e, também, o das comunidades portuguesas. As famílias, com dois salários e um relacionamento mais igual e mais aberto entre si e com os outros, compatriotas ou estrangeiros, integraram-se mais rapidamente e melhor – o casal e os filhos, em simultâneo (Leandro, 1995:50 )
O mundo associativo refletia (e, em muitos casos, promovia) esta realidade, com a recriação de espaços extra- territoriais de língua e de costumes portugueses, que, em muitos casos, progressivamente se abriram à sociedade local. A participação de mulheres, de famílias inteiras foi determinante na transformação de clubes masculinos – pontos de encontro, como as tabernas ou cafés de aldeia - em autênticos centros de cultura popular, com o folclore, o teatro, o restaurante de sabores caseiros, o desporto, e até as escolas, quando não existiam, por iniciativa pública. É de notar que o envolvimento das mulheres na liderança associativa (muito raro, em França, e por todo o lado, nas décadas de 60 a 80) se ficou a dever, sobretudo, ao propósito de organizar o ensino da língua – atividade em que, como docentes, quase sempre tiveram papel preponderante.
Deveremos, pois, concluir que, no passado longínquo, como no recente (na chamada “emigração a salto”), elas contribuíram para a inclusão social da comunidade familiar no país de destino, para o alongamento das estadas, e, igualmente, para uma tendência de não retorno, em sintonia com as segundas gerações. (Ramos, 2009:49) Por isso, ao contrário do que se esperava, nem todos regressaram no refluxo migratório que, até ao fim dos anos 80, trouxe de volta ao país, mais de meio milhão de portugueses. E, em compensação, nas comunidades do estrangeiro, elas tornaram-se as guardiãs da língua, da memória das origens, das tradições e dos modos de estar, de que se tecem, discretamente, as malhas, não do Império, que é sempre obra do Estado, mas da Diáspora, da Expansão cultural, que são feitos de pura sociedade civil.
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 2 - LIBERDADE DE EMIGRAR E POLÍTICAS INDIFERENCIADAS

A história das políticas de emigração em Portugal mostra que mais facilmente mudaram os regimes do que as recorrentes medidas de controlo e condicionamento dos fluxos de saída, de captação de remessas, de omissão de apoios significativos fora das fronteiras territoriais. Da monarquia tradicional à constitucional, do regime monárquico à Republica e desta à ditadura do "Estado Novo", neste campo, pouco foi o que mudou.
Os serviços iam sendo criados - Comissariado da Emigração, em 1919, Junta de Emigração em 1948- para prosseguir, essencialmente, objetivos semelhantes
As primeiras medidas de proteção foram tomadas para responder a críticas, de que a imprensa se fazia eco, às péssimas condições de transporte marítimo, a doenças e mortes a bordo e limitavam-se ao acompanhamento durante a viagem transoceânica " (políticas do trajeto de ida", na expressiva formulação de Maria Beatriz Rocha Trindade). Os prenúncios de viragem, embrião de políticas de apoio social, foram protagonizados pelo Secretariado Nacional da Emigração, e ficaram a dever-se, do mesmo modo, ao dramatismo da situação. ao crescente conhecimento público da sua dimensão, das condições de exploração salarial e de alojamento nos tristemente célebres “bidonvilles” dos subúrbios de Paris e outras grandes cidades.
A revolução de 1974, foi a primeira das revoluções que repercutiu, de imediato, no cerne das políticas de emigração, com a liberdade de sair e regressar, o reconhecimento da igualdade de direitos para os expatriados - direitos de participação política, direito à proteção do Estado - e com a criação de uma Secretaria de Estado da Emigração, responsável pela definição e execução de políticas inovadoras. Contudo, estas não se dirigiam ainda às migrações femininas, com a consciência e reconhecimento das suas especificidades, a par das especificidades das migrações masculina.
Para todos, a Constituição proclamava a igualdade de direitos, impondo ao Estado a criação de condições para a sua efetivação, “maxime” no que respeita à participação dos dois sexos na vida pública. Porém, o organismo que foi constituído, em Lisboa, para esse fim, uma comissão para a igualdade (designação genérica que aqui adotamos para um departamento cuja denominação tem variado bastante mais do que os seus objetivos, nas últimas quatro décadas) desenvolveu a sua ação centrada no território, sem olhar as comunidades do exterior, como poderia ter feito, articulando estratégias e planos com os serviços da Secretaria de Estado da Emigração, que, por seu lado, ignorando as situações concretas das migrantes, não suscitaram, para lhes dar resposta a colaboração de sucessivas comissões para a igualdade de género. Assim foi, pelo menos até à meia década de 80.
O mesmo descaso é patente nas reivindicações do órgão instituído, em 1980, para a co-participação na definição de políticas públicas neste campo, o Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP)
Pode perguntar-se o porquê dessa omissão persistente, num tempo de “feminização” das correntes migratórias, com conhecidas dificuldades de inserção, que começavam na precariedade do seu estatuto jurídico. De facto, era, então, um lugar comum destacar a "dupla discriminação" das mulheres, enquanto mulheres e enquanto estrangeiras. Discriminações para as quais muitas mulheres tinham sabido encontrar saídas engenhosas .o que, porém, só viria a tornar-se  conhecido com a publicação dos primeiros estudos científicos sobre famílias portuguesas, realizados na região de Paris (Leandro, 1995)
Uma das explicações para a inação dos governos poderá encontrar-se na falta de um paradigma, em termos de direito comparado, visto que a audiência e representação política das migrantes eram igualmente descuradas nos outros países de emigração do sul da Europa
Outro fator que pesou negativamente foi o desinteresse do movimento associativo pelas questões de género. Concretamente, o desinteresse dos seus dirigentes (quase só homens), que se somava à marginalização da situação das mulheres migrantes nos movimentos feministas de inícios do século passado (Aguiar, 2008:1248) e ao distanciamento do associativismo feminino das comunidades face às questões de sufragismo e empoderamento feminino, (concentrando esforços nas áreas mais tradicionalmente femininas da solidariedade e da beneficência).
Esta realidade refletiu-se no funcionamento do Conselho das Comunidades Portuguesas, enquanto órgão consultivo do governo, cujos membros provinham do universo associativo. Não havia uma única conselheira eleita no 1º Conselho, que reuniu em abril de 1981, nem houve uma única recomendação sobre os problemas da emigração feminina (5)
Uma segunda eleição, em 1983, trouxe ao CCP duas jornalistas e a uma delas, Maria Alice Ribeiro, de Toronto, se deve a primeira chamada de atenção para as carências de audição das mulheres. Na reunião regional da América do Norte, em outubro de 1984, submeteu a debate uma proposta inédita de convocação de um encontro mundial de mulheres, que obteve fácil aprovação. O governo deu imediata sequência à ideia e o encontro teve lugar em Viana do Castelo, em Junho de 1985, com a presença de portuguesas que, nas principais comunidades dispersas pelo mundo, se dedicavam ao jornalismo e ao associativismo (as duas componentes do CCP). e que aí fizeram um amplo levantamento de situações e de potencialidades, olhando as comunidades nas suas múltiplas componentes, incluindo a de género. No fim, apresentaram recomendações e conclusões, convertendo a reunião numa espécie de CCP no feminino, com um discurso muito focado em aspetos culturais e sociais e, por isso, aberto e consensual. E manifestaram a intenção de constituir uma organização internacional feminina da Diáspora, que pudesse continuar o diálogo com o governo, para repensar as grandes linhas de políticas futuras.
O Encontro de 1985 coincidia com o fim da década das Nações Unidas para a Mulher e Portugal tornava-se, através dele, e das soluções aí expressas, um país pioneiro nas políticas de “empoderamento” das mulheres, que seria, dez anos depois, uma das principais recomendações da IV Conferência das Nações Unidas (Rego, 2012:96,)
Em 1987, a organização internacional prefigurada nas conclusões do Encontro de Viana, ainda não estava estabelecida e a proporção de mulheres no CCP não aumentara expressivamente. Neste quadro, a Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas tomou a iniciativa de promover uma conferência para a participação das mulheres", que, funcionaria, com carater periódico, a par de várias conferências sectoriais, na órbita do CCP. A queda do governo, nesse ano, levou a grandes alterações na vida do Conselho, que acabaria por ser extinto, e, com ele, se perdeu a estratégia de mobilização subjacente às "conferências". A experiência pioneira de promover políticas mais inclusivas em termos de género foi, assim, abruptamente interrompida, num longo interregno, que adiou por décadas o desenvolvimento de ações positivas destinadas às migrantes.


POLÍTICAS PARA A PARTICIPAÇÃO CÍVICA E POLÍTICA DAS MULHERES EMIGRANTES

O impulso para o relançamento das políticas públicas neste sector veio, novamente, da sociedade civil, através de uma associação ("Mulher Migrante - Associação de estudo, cooperação e solidariedade), formada, em1993, por algumas das participantes do Encontro de Viana, ligadas à emigração por laços diversos - emigrantes, funcionárias e funcionários dos serviços da Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas, investigadoras e investigadores, jornalistas, militantes de movimentos feministas ou de sindicatos - todos liderados por uma portuguesa do Brasil, então a residir temporariamente em Lisboa, a Eng.ª Fernanda Ramos ( 6). 
A associação, apesar da sua pequenez inicial, conseguiu concretizar, a par e passo, o objetivo principal, que era o despertar a consciência para um vazio de atuação pública, neste terreno, perante o desinteresse geral da sociedade portuguesa, e até também das comunidades do estrangeiro, inspirando-se nos ensinamentos do 1º Encontro mundial e no paradigma, aí testado, de diálogo e de cooperação Estado - sociedade civil, Foi, assim, obtendo a anuência dos interlocutores para propostas irrecusáveis, desde logo porque permitiam a entidades oficiais vencer a inércia em matérias da sua competência.
Durante um primeiro ciclo, entre 1993 e 2005, a cooperação estabeleceu-se, sobretudo, com a comissão para a igualdade, sedeada junto do Conselho de Ministros. Esta centrava, como referimos, a sua ação prioritária dentro de fronteiras -  havendo a mencionar, contudo, pelo menos um caso exemplar de boa colaboração da “Comissão” numa iniciativa da SECP desenvolvida na sequência da adesão do país à CEE::uma série de cursos de formação profissional para mulheres, realizados nas principais comunidades portuguesas da Europa (Paiva, 2005:15)
A primeira iniciativa da Comissão que abarcara as portuguesas do exterior fora, em 1994, sob a presidência de Ana Vicente, a realização de um colóquio internacional sobre "O rosto feminino da Expansão portuguesa", com muitas dezenas de personalidades do mundo académico lusófono, (embora com poucas representantes da emigração contemporânea), e um enfoque principal no tempo passado. Uma década depois, em 2003, a Presidente Maria Amélia Paiva, abriu o seu mandato, com um colóquio internacional sobre "Mulheres Migrantes Duas faces de uma Realidade", dizendo: “[…] é a primeira vez que, em Portugal, um serviço do Estado organiza em colaboração com outros organismos e instituições um seminário sobre mulheres migrantes” (Paiva, 2005: 14).Ou seja, abrangendo as estrangeiras em Portugal e as portuguesas no estrangeiro.
Anteriormente, como dissemos, a "Comissão" limitara-se a subsidiar, nesta área, estudos, colóquios, debates, ações de sensibilização promovidos pela Associação “Mulher Migrante”, sem, contudo, as ter enquadrado como um eixo principal da sua programação. As emigrantes portuguesas permaneciam, pois, numa "terra de ninguém" das políticas públicas, visto que a SECP persistia em ignorar as particularidades da sua situação no estrangeiro, e o CCP também, depois que ressurgira em 1996., em novos moldes, com eleições realizadas por sufrágio direto e universal. A adoção desta forma de eleição tinha trazido a cena um pequeno número de mulheres, que, contudo, não logravam pôr na ordem do dia dos plenários as questões da igualdade. É de realçar que o fizeram, com sucesso, ao nível de alguns países, sobretudo na América do Norte (7).
A rotura com esta atitude de indiferença dos poderes públicos verifica-se no ano de 2005 e parte de uma proposta apresentada pela Associação Mulher Migrante ao Secretário de Estado das Comunidades Portuguesas António Braga para a organização de um 2º Encontro mundial de Mulheres da Diáspora. Era uma forma de comemorar a passagem do 20 º aniversário do Encontro de Viana e de lhe dar prossecução, a nível governamental
António Braga aceitou a ideia de imediato, mas imprimiu ao projeto um desenho original, começando por convocar, ao longo de quatro anos, reuniões nas grandes regiões do mundo, onde as migrações no feminino apresentam caraterísticas muito diversas, para terminar com um congresso mundial em Portugal, no ano de 2009.
Embora o governo fosse o impulsionador da iniciativa, preferiu manter-se como o principal interlocutor em grandes Encontros, cuja preparação e execução ficavam diretamente a cargo de ONG's - a associação”  Mulher Migrante “e outras organizações atuantes dentro do país, na área dos direitos da mulher e dos direitos humanos, em estreita colaboração com as associações das comunidades em cada uma das regiões. O ciclo iniciou-se na América do Sul (Buenos Aires, 2005), prosseguiu na Europa (Estocolmo, 2006), na América do Norte, costa leste (Toronto, 2007),na África (Joanesburgo, 2008), e na América do Norte, costa oeste (Berkeley, 2008), terminado com um  Encontro internacional (em Espinho,) com a participação de relatoras de cada uma das reuniões regionais. (Aguiar, 2009:33-44).
Em todas elas estiveram envolvidas as missões diplomáticas portuguesas e presente o governo, através do Secretario de Estado das Comunidades, António Braga ou do Secretário de Estado da Presidência, Jorge Lacão, que detinha a tutela da comissão para a igualdade. Tratou-se, assim, de uma verdadeira parceria Estado/ Sociedade Civil. Em cada região e país, as responsabilidades foram partilhadas por embaixadas e consulados, por instituições privadas - a Associação da Mulher Migrante Portuguesa da Argentina, a Federação das Associações de Mulheres Lusófonas (PIKO), na Suécia, a associação "Working Women" e outras, no Canadá, a Liga das Mulheres Portuguesas na África do Sul, e o Departamento de Estudos Europeus da Universidade da Califórnia em Berkeley, nos EUA.
Indiciador do estado de autêntica dormência em que se haviam mantido as políticas de género nas comunidades do estrangeiro, durante cerca de duas décadas, é a consonância nos discursos dos Secretários de Estado das Comunidades Portuguesas em 1985 e em 2005, reconhecendo, do mesmo modo, e quase com as mesmas palavras, a falta de atenção de que as portuguesas expatriadas se podiam queixar.
Em 2005, António Braga manifestava a intenção de "retomar" nas políticas públicas, "a questão de género que tem andado esquecida ao longo dos anos" (8)
Jorge Lacão, no Encontro de 2006 e na Conferência para a Igualdade em Toronto, com a mesma compreensão, assumia que o dever constitucional imposto ao governo de promover a igualdade entre mulheres e homens se estende ao espaço da emigração, dizendo que: “No seu programa, o XVII governo português comprometeu-se a estimular a participação cívica dos membros das comunidades portuguesas, tendo como princípio orientador a Igualdade de Oportunidades entre todos os portugueses e todas as portuguesas, nomeadamente a igualdade de género, independentemente de serem ou não residentes em Portugal" . E foi mais longe ao reconhecer que a igualdade de género ganhara o seu lugar central, “através da transversalização da perspetiva de género em todas as áreas prioritárias de política social, económica e cultural (gender mainsteaming), ao qual se associam medidas de carater positivo onde persistem notórias assimetrias de género”.(Lacão, 2009:9)
Era esse, notoriamente, o caso da (não) participação igualitária no mundo associativo da Diáspora, que, na maior parte dos países de destino, sobrelevava eventuais discriminações persistentes em sociedades estrangeiras, onde, aliás, a integração não só é conseguida, mas frequentemente, impulsionada pelas mulheres (Ramos, 2009:49). Por isso, o enfoque prioritário do programa para a igualdade 2005/2009 foi posto nas questões de cidadania, de inclusão no plano da intervenção cívica e política, da liderança do movimento associativo.
O CCP, como órgão consulta e de representação dos portugueses do estrangeiro, onde, como constatámos, o papel das mulheres fora sempre secundarizado, tornou-se o alvo da primeira aplicação da "Lei da Paridade",. Voltou, assim, a fazer história das políticas de género, apesar dos resultados, até hoje algo dececionantes da aplicação da Lei na sua composição e funcionamento
Um novo passo, de valor grande simbólico, foi dado na Assembleia da República com o debate e a aprovação da Resolução nº 32/2010 sobre a igualdade de género na emigração.
Nunca antes o parlamento português se debruçara sobre esta problemática, instando o governo a ação imediata e continuada, apontando a via da cooperação estreita entre Estado e ONG's das comunidades, fazendo do "congressismo" - colóquios, debates, jornadas de reflexão . um dos instrumentos privilegiados de sensibilização para a igualdade.
O XIX governo constitucional, empossado em 2011, com o Secretário de Estado José Cesário (que, na qualidade de deputado, havia sido o autor da referida proposta de recomendação), reiniciou, prontamente, o diálogo com as associações - a “Mulher Migrante” e outras - com vista à prossecução das políticas para a Igualdade e patrocinou, logo em novembro desse ano, um Encontro Mundial realizado na cidade da Maia.
Retomada foi também a alternância entre reuniões nas diversas comunidades e congressos mundiais em Portugal (o último dos quais, até à data, decorreu em 2013, em Lisboa, no Palácio das Necessidades), seguido em 2014 de uma série de colóquios em Portugal e no estrangeiro, sobre o impacte da revolução de 1974 e do restabelecimento da democracia no campo das migrações. Como tem vindo a acontecer no “congressismo” de que falamos, é importante pôr em diálogo e interação dois mundos que nem sempre convivem facilmente: o associativo e o político, por um lado, e o académico, por outro
Ao longo desta última década, a mais fértil em medidas positivas, consequentes à assunção pelo Estado dos seus deveres promover a igualdade decorrentes do art. 9, conjugado com o art. 109, da Constituição, não só dentro como fora dos limites territoriais, o acento foi muitas vezes colocado na cultura, no ensino, onde as mulheres migrantes mais têm acedido à igualdade. E, também, no conhecimento, na investigação, na análise das migrações femininas, cuja escassez no passado distante, como no ainda recente, muito prejudicaram a eficácia das políticas, o seu ajustamento às realidades plurais e em rápida mudança, pela invisibilidade das mulheres e dos seus problemas.
A terminar, queria renovar o agradecimento pelo convite da Prof. Doutora Maria da Conceição Ramos para participar na sessão de encerramento de mais um esplêndido congresso "A Vez e a Voz da Mulher".O êxito e continuidade destes congressos, ao longo dos anos e em diversos continentes, deram ao movimento, nascido e desenvolvido na sociedade civil, uma expansão internacional, que a par da sua qualidade intelectual e científica, o singularizam no universo da diáspora portuguesa (e não só da diáspora feminina). Um paradigma que mulheres de grande cultura e saber, de grande visão, oferecem ao país, e aos seus governos, dizendo-lhes com a sua Voz que é tempo das Mulheres terem a sua Vez, no centro das políticas e da vida das sociedades do século XXI.

Notas

(1) A Comissão da Condição Feminina, sempre mais preocupada com a condição das portuguesas residentes no território, ao lançar um primeiro olhar sobre o fenómeno de expatriação feminina, começa justamente por estas grandes mulheres, que, longe de solo pátrio, deixaram o seu nome na História.
Nas duas décadas que se seguiram à Revolução de 1974, apenas uma das publicações da Comissão incide sobre a temática da emigração – o14º Caderno da Condição Feminina (1982), da autoria de Karin Wall – “A outra face da emigração: estudo sobre a situação das mulheres que ficam no país de origem”. Note-se o enfoque nas mulheres que ficaram, não nas que partiram…
(2) O Autor destaca, em vários trechos da sua publicação, a total oposição entre as políticas dos dois Estados peninsulares, referindo as sucessivas medidas legislativas de Castela para promover a reunificação das famílias, no Reino ou no ultramar   a sua modernidade, mesmo por padrões de hoje -   e a inexistência dessa preocupação em Portugal - à época, já um verdadeiro anacronismo.
(3 Júlia Néry tem, para além dos seus reconhecidos méritos literários, a virtude de nos levar a pensar nas “orfãs”,  não como mero tessitura de experimentação política, no caso de políticas de europeização da nossa colonização, mas como pessoas com os seus sentimentos, medos, resistência ou sujeição a duras condições, preconceitos, imposições… Ficção sugestiva do que terá sido destino de muitas jovens. O preço humano das políticas, numa leitura feminista.
(4) Joan Margaret Marbeck foi bolseira da Gulbenkian e continua hoje a desenvolver uma luta constante pela sobrevivência de uma fala em risco de se perder, como expressão de uma comunidade euro asiática, luso malaia, em que a tradição cristã impera – e daí a sua designação como “Kristang ”
(5) A recolha e tratamento das recomendações do CCP nos seus primeiros anos de funcionamento (1981-1985) publicada pela Secretaria de Estado das Comunidades Portuguesas é reveladora da invisibilidade da mulher, da sua situação, dos seus problemas no órgão oficial de co-participação nas políticas para a emigração, então, como vimos, eleito no universo associativo. As mulheres estão duplamente ausentes do CCP:
na ausência física, (apenas em 1983 surgem as primeiras conselheiras, jornalistas com o estatuto de “observadoras” – que era o dos jornalistas, na economia do diploma fundador do CCP . o DL 373/8 de 12 de setembro); na ausência como destinatárias de propostas concretas. Num total de 268 recomendações analisadas, a palavra “mulher” surge apenas uma vez na parte relativa a “condições de trabalho e estadia nos países de acolhimento”, na recomendação 35, que aconselha o governo a “sensibilizar as famílias que pretendem emigrar para a Austrália para a eventualidade de o cônjuge (mulher) ter um melhor acesso ao mercado de trabalho do que o outro cônjuge, por forma a evitar situações familiares e sociais conflituosas.
 “Mulher” surge, assim, entre parênteses e num contexto negativo, ao exprimir a preocupação de ela poder vir a gozar de uma situação laboral demasiadamente boa… O Governo, como era de esperar, declinou o conselho. De positivo, nesta singular exortação, apenas o revelar que, ao contrário do que sempre se prevê, nem sempre a mulher, por ser mulher, é objeto de discriminação no país de acolhimento.
 De salientar que é justamente neste capítulo que algumas, poucas, recomendações, embora falem de “cônjuge” se referem ao estatuto jurídico da mulher, no quadro da reunificação familiar. Ao invés do que acontece com as mulheres, os filhos, os jovens são mencionados expressamente no texto de várias recomendações
(6) Fernanda Ramos, grande empresária em Minas Gerais, viúva e mãe de nove filhos, era senhora de um vasto curriculum no associativismo, em Belo Horizonte e em todo o Brasil, tendo sido a primeira mulher eleita presidente do Elos Clube Internaciona

(7) No Canada, o coordenador do CCP, Conselheiro Manuel Leal, teve uma ação notável neste campo, promovendo uma série de seminários e ações de sensibilização para a igualdade, acompanhado, sobretudo pela Conselheira Maria Alice Ribeiro. Nos EUA, foi a Conselheira Manuela Chaplin quem desenvolveu iniciativas semelhantes, com o apoio do coordenador do CCP neste país, conselheiro João Morais.
 Na América do Sul distinguiu-se o Conselheiro Luís Panasco Caetano, que representava o Uruguai e um conjunto de outros países com pequenos núcleos de portugueses , e mantinha contactos  estreitos com o movimento associativo no sul do Brasil e Argentina (é um dos históricos dinamizadores dos “Encontros do Cone Sul”).. Em vários desses países, foi ele que diligenciou uma multiplicidade de encontros informais, visando o envolvimento das mulheres no associativismo, em colaboração com a associação “Mulher Migrante”
(8) António Braga reconhecia, em Buenos Aires, em novembro de 2005 quanto a questão de género tinha “andado esquecida ao longo dos anos, como, 20 anos antes, no encerramento do Encontro de Viana, a sua antecessora no cargo, eu mesma, tinha sublinhado a "[...] ausência de participação, de voz, de reconhecimento, de poder, ao menos de poder formal nas instituições",. Também, as participantes no Encontro de 1985 denunciaram, com veemência, "a pouca audição que tem sido dada às mulheres portuguesas no estrangeiro".


                                                                               
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