abril 25, 2009

Quotas contra quotas

I- Muitas são os cidadãos - mulheres e homens - que se manifestam contra a "Lei da Paridade" e o seu instrumento operativo, a previsão de quotas para o sexo subrepresentado nos diversos cargos políticos. São os que ainda acreditam que, no interior dos partidos políticos, as escolhas se fazem, por "mérito" e que basta, por via de regra, o mérito para se ser escolhido, independentemente do sexo...
Foi com argumentos desta ordem que o PR vetou uma mais impositiva versão original da Lei (se bem se lembram, o seu primeiro veto!)
O mérito!
Em anos e anos de militância partidária - coisa do meu passado, definitivamente passado, mas nem por isso esquecido nos seus ensinamentos - não vi ninguém promovido a candidato por puro "mérito" , desacompanhado de outros atributos ou qualidades, tais como a activa militância em facções, a amizade ou fidelidade aos "poderosos" (num mundo, onde o poder é masculino) ou a popularidade alcançada, não raro, em domínios que não qualificam para este tipo de serviço à "res publica" .
O recente processo de selecção para a lista "europeia" do PPD/PSD, que foi mais tardio e mediatizado do que os dos outros partidos, exemplifica particularmente bem a minha tese.
Como se tornou público, no "sobe e desce" na escala dos potencialmente elegíveis, determinante acabou por ser, em toda a linha, a "força das armas" (no sentido das armas adequadas aa combate de que se trata) ou, se preferirem, as afinidades e ligações partidárias de cada um.
Reconhecida competência deu o segundo lugar ao único "sobrevivente" do mandato cessante, Carlos Coelho, mas a verdade é que também não lhe falta suporte das cúpulas do PSD - porque se faltasse não continuaria, de pouco lhe valendo todas as suas iniciativas e dinamismo.
O critério partidário dominante tende a premiar fidelidades (escolhendo "one of us", como diria Thatcher) não a procurar, desinteressadamente, os "melhores". A palavra-chave é "alinhamento" , seja em grupos maioritários ou minoritários , visto que estes também têm a sua"quota", mais ou menos proporcional à dimensão ou peso político estimado.
Não quero com isto dizer que não possam coincidir dois critérios ou duas lógicas, juntando-se, então, o útil ao agradável - ou seja, a excelência ao "companheirismo" . Há gente capaz dentro de todos os partidos, mulheres e homens - com certeza que há ! O problema é que, tanto entre os melhores, como entre os piores, são muito mais os homens do que as mulheres, e não pela boa razão, que só poderia ser o valor individual...


II- Vamos, então, passar ao arriscado exercício de sopesar as questões de "mérito relativo", na hierarquização da lista proposta pelo Partido Social Democrata.
Em primeiro, o nome de Paulo Rangel, a meu ver, não se discute - é muito bom, como o seria Marques Mendes, e, francamente, de momento não vislumbro mulheres com melhor perfil para a missão.
Em segundo, o já referido Carlos Coelho, com provas dadas, embora não o deslustrasse vir atrás da antiga Ministra da Ciência, de Durão Barroso, que ocupa a terceira posição, em obediência aos ditâmes da Lei...
Em quarto, Mário David, com experiência na área internacional (e também, por sinal, muito próximo de Barroso). Aceita-se, nesse ou outro lugar.
E em quinto? Bem, o quinto é a "quota" da poderosa Região Autónoma da Madeira. É, nas palavras do "Correio da Manhã", " o desconhecido Nuno Teixeira". Sem mais comentários...
Em sexto, dupla quota: a quota da paridade e a quota dos Açores.
A acreditar no relato dos jornais (no plural, note-se...), para conseguir um lugar elegível, o PSD-Açores terá substiuido o seu anterior deputado por uma mulher, assim aproveitando uma oportunidade de posicionamento aberta pela nova regulamentação. Maria do Céu Patrão Neves é professora catedrática de Ética, na Universidade dos Açores - uma indigitação prestigiante para o conjunto dos candidatos, que até ficaria bem lá mais acima...
Em sétimo , Regina Bastos, uma antiga deputada da Assembleia da República e, também, antiga deputada do Parlamento Europeu. Com "curriculum" de sobra .. . Não entrou pela regra da paridade, que a relegaria para a nona posição - de duvidosa elegibilidade - mas, como quase todos os colegas do género masculino, pela "quota da distrital" (de Aveiro). É esse o caso dos "representantes" da distrital de Braga, um autarca, colocado em oitavo, e da JSD, em nono...
Indiscutível, felizmente, a qualidade das três senhoras - todas acima da média!
Nem seria preciso tanto :bastava a "igualdade de competências", que, na minha óptica, é, sempre, o pressuposto ético das leis da paridade.
A sua aplicação correcta depende, pois, das escolhas em concreto... Excelentes, porventura a exceder expectativas, as do PSD, neste primeiro teste de aplicação de uma lei mal amada.
Piores, as do PS, paladino da "paridade à portuguesa": entre os nove primeiros titulares, inclui apenas três mulheres, duas das quais já são candidatas à presidência de Câmaras. Se vencerem, terão homens como substitutos. E, assim, veremos o próprio partido-legislador (autor, proponente, votante) defraudar os objectivos da sua lei...
Dos maiores partidos, o único que se limita ao cumprimento dos "mínimos legais" é, precisamente, o PS. Estranho! Ou talvez não, se olharmos a composição tão pouco paritária do Governo Sócrates, que fica, neste aspecto, àquem do de Durão Barroso, para não falar sequer dos governos em perfeito equilíbrio de género de Zapatero ou de Sarkozy.
O PSD, opositor declarado da legislação da paridade, na hora da verdade, não hesitou em demonstrar que, por sinal, não lhe faltam candidatas de mérito para preencher quotas (em conjugação com outras variantes de quotas - as que não são vistas como tal...).
Com isso ,na prática, e contra os argumentos teóricos da esmagadora maioria dos seus dirigentes revela, afinal, que a Lei da Paridade serve a Constituição, a República e a Democracia.

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