maio 09, 2010

A Homenagem ao Prof. Mota Pinto

Ontem, em Viana do Castelo.
O Instituto Carlos Mota Pinto para a formação política, foi constituido nessa cidade, por iniciativa do PSD local. A coincidir com o 25º aniversário do falecimento daquele insígne professor de Direito e Estadista.
Estadista: Se alguém merece este título, plenamente, a par dos seus títulos académicos, alcançados com brilhantismo universalmente rconhecido, é, sem dúvida, ele.
A homenagem veio romper um longo ciclo de silêncio sobre a memória, a obra de Mota Pinto.
Não sei que impacte mediático virão a ter as notáveis intervenções que ouvimos, por esta ocasião, em Viana, incluindo, na sessão de encerramento, as de Passos Coelho e de Paulo Mota Pinto. Se não for o devido, fica a esperança de que o trabalho futuro do Instituto, possa contribuir, de facto, para formar politicamente jovens mais conhecedores da história do partido e dos seus fundadores, que tiveram um papel de primeiríssimo plano no renascimento da democracia portuguesa, no pós 25 de Abril.
É certamente o caso do Doutor Mota Pinto.
Ele era um dos líderes do "núcleo de Coimbra", que aderiu ao PPD desde a primeira hora: os professores universitários, que foram os principais redactores do programa do novo partido: além de Mota Pinto, Figueiredo Dias, Barbosa de Melo, Pereira Coelho, Xavier de Basto, todos da Faculdade de Direito, para além de outros, que pessoalmente não conheço tão bem.
Mota Pinto foi o primeiro líder da bancada do PPD na Assembleia Constituinte - e foi quem deu o nome de "Assembleia da República" ao parlamento democrático recém eleito.
Aspectos que foram lembrados em Viana, assim como o essencial do seu percurso de Homem político, sempre disponível para, nas situações mais difíceis, servir desinteressadamente o País, sempre pronto a deixar os cargos, quando entendia que (por razões que foram muito diversas...) se havia esgotado o sentido da sua missão!
Aquela frase "tenho sempre as chaves do meu carro no bolso" foi muitas vezes citada..
Foi Ministro, Primeiro Ministro, Vice Primeiro Ministro, presidente do PPD-PSD.
Soube assumir responsabilidades, soube assumir rupturas. Sempre de boa fé e com a melhor das intenções - o que eu acho que é reconhecido por todas as pessoas que com ele conviveram, de perto, ainda que dele discordassem.
Um Homem extraordinário, pela sua inteligència e cultura. Prestigiadíssimo como académico: não há coleaga, não há antigo aluno, seja qual fôr a cor política, que o não considere, do ponto de vista científico e pedagógico, como do ponto de vista humano, um ser de excepção!
Em Coimbra, a "lenda" de Mota Pinto corresponde à realidade.
Porém, a nível nacional, isso está muito longe de acontecer. Acho que ele foi dos políticos que teve "pior imprensa" - a partir dos media lisboetas, amplamente dominados por personalidades das correntes que mais se lhe opuseram dentro do próprio PPD/PSD. Apesar disso, é, indiscutivelmente, uma das figuras exemplares da nova República, pela sua estatura intelectual e moral - pela sua integridade.
Mas o Homem que ele foi, tão generoso, tão simples e natural no convívio com o povo, com a "arraia muida" (a começar pelos alunos...), tão conversador, tão aberto às diferenças de opinião, tão simples e leal no trato, com uma capacidade de argumentação e um sentido de humor tão característicos - arguto, contundente, mas nunca demais, porque respeitava sempre o interlocutor ! - esse Homem não tem sido assim retratado perante o País.
Nem no seu perfil humano, nem na relevância política que teve na estabilização democrática do país.
O seu governo, um governo de iniciativa presidencial, que durou de Novembro de 1978 a 1 de Agosto de 1979, foi o primeiro governo de viragem, após o 25 de Abril: o 1º governo não socialista.
Corajosamente, como foi dito em Viana, ele recuperou os valores da noção de Pátria, da bandeira, que andavam banidos e conotados, estupidamente, ao antigo regime. Corajosamente, ele mostrou que era possível implantar a ordem e a lei democráticas, que Portugal não era mais "governado pela rua", pelas manifestações sindicais.
O Povo acreditava ainda que, acima da força do voto, estava a força das manifestações de rua, da extrema esquerda militar, que não aceitariam nenhum governo à direita do PS.
Mota Pinto arrostou essas forças e governou, porque foi preciso, contra elas. E o Povo passou a acreditar que podia votar sem constrangimento, que o País era governável em qualquer quadrante democrático. E bem, porque se tratou de um governo excepcional, determinado, audaz, competente e coeso.
Nas eleições seguintes, deu a vitória à AD de Sá Carneiro, a primeira alternância democrática resultante de um sufrágio popular. Daí em diante Portugal estava pronto, como se tem visto, para todas as alternâncias. Ou seja, para a democracia!
Sem Mota Pinto quando teria isso acontecido?
No seu regresso à política, em 1983, após a fragosa queda da AD, coube-lhe o papel de numa segunda versão dos "governos de salvação nacional" - o chamado Bloco central - evitar a bancarrota e criar as condições de adesão à CEE, logo em 1985.
Sá Carneiro, Mário Soares e Mota Pinto foram, a meu ver, os homens que mais contribuiram para moldar a nova República portuguesa, no período aureo, em que venceu os riscos de degenerar em ditadura.
Sem esquecer, evidentemente, os militares que lançaram o movimento de Abril, arriscando vidas e carreiras, os líderes de outros partidos, de outras ideologias, e tantas personalidades notáveis que, então, vieram, por convicção, para a política, e depois se afastaram.
Mas a República que herdamos, sólida, e que vemos em declínio, hoje, a eles mais do que a quiaquer outros se deve.
A nossa esperança - porque ainda há esperança - está numa segunda vaga de políticos de envergadura, que eu vejo despontar em Passos Coelho.

6 comentários:

Maria Manuela Aguiar disse...

Nessa cerimónia estive em representação da Câmara de Espinho, porque o Dr. Pinto Moreira vai, desde há dias, a caminho de Fátima. Mas, de qualquer forma, sempre faria questão de estar presente, a título individual, como cidadã, como admiradora e como amiga.

Maria Manuela Aguiar disse...

Foi uma sessão animada por excelentes oradores, excelentes intervenções, mais sobre a veste pública do homenageado, a sua obra, do que sobre a pessoa, tal como a conheceram os amigos - mas, aqui e acolá, deram-nos vislumbres dessa faceta mais privada, que o tornava, como dizia um "slogan" de propaganda da sua campanha eleitoral de 1983, "o homem que é bom conhecer de perto". (se não era este o preciso fraseado, era esta a ideia, com a qual estou de pleno acordo!).

Maria Manuela Aguiar disse...

Caso da história contada pelo Daniel Proença de Carvalhom que foi o seu Ministro da Comunicação Social: à revelia das normas de segurança levava a casa, no seu automóvel privado, o Doutor Mota Pinto, depois de um jantar, quando depararam com uma senhora, que tentava empurrar o carro.
Logo o Doutor Mota Pinto sugeriu que parassem para ajudar a senhora, surpreendidíssima de ver o primeiro Ministro do país a empurrar-lhe o carro, pela rua abaixo!
Outro qualquer, na melhor das hipóteses, chamava a polícia ou a segurança...

Maria Manuela Aguiar disse...

Tudo em ambiente de emoção, de saudade, mas dentro das regras protocolares - com uma excepção: a interrupção de Amândio de Azevedo, (antigo Ministro do Governo do "Bloco Central"), a marcar uma discordância pontual com Pedro Passos Coelho, que fazia o discurso de encerramento.
De repente, a sessão solene quase se converteu em debate!
A reacção de Passos Coelho foi, simplesmente, admirável!
Ouviu, imperturbável, com serenidade. Mais: com simpatia! Mais tarde, voltou a fazer uma breve referência ao ponto de vista de Amândio Azevedo.
Não estou a ver amaioria dos ex-líderes do PSD a reagir assim, numa situação idêntica.
Sempre acreditei em Passos Coelho precisamente porque o acho genuíno. Parece "bom demais para ser verdade", mas é "verdade"!
As suas reacções são, sem esforço, as de um verdadeiro democrata, porque ele é um verdadeiro democrata.

Maria Manuela Aguiar disse...

Conheço Passos Coelho apenas da cena política, mas de um ponto privilegiado, como era a comissão política de Cavaco Silva, a que ambos pertencíamos - ele por inerência, como presidente da JSD, eu por convite do Prof Cavaco.
O Doutor Mota Pinto conheci-o como estudante de Direito em Coimbra, há quase meio século. Só não foi meu professor porque, quando fiz a sua cadeira, estava ele na Guiné, em serviço militar e substituído, na Faculdade pelo Doutor Alarcão.
Creio que lhe fui apresentada por um dos assistentes, já não me lembro qual e em que circunstâncias - numa das ocasiões em que veio de férias a Coimbra. Mas recordo-me de inúmeras conversas, nos cafés, nos corredores da faculdade...
Gostava de falar com os estudantes, Fazia-o com imensa simplicidade e cordialidade. Raros eram os "Doutores" de Coimbra que, nesse tempo, assim se davam com a juventude...
E politicamente era, sem dúvida, um democrata. Em tempo de ditadura, não se podia dizer o mesmo de muitos dos seus colegas...

Maria Manuela Aguiar disse...

O directo responsável pela meu involuntário ingresso na política foi o Doutor Mota Pinto.
Aceitei o convite para ser Secretária de Estado do Trabalho do seu Governo, em Novembro de 1978.
Não estou arrependida. Voltaria a dizer-lhe "sim".
Voltaria a dizer "sim" ao Dr Sá Carneiro. em Janeiro de 1980 (para a Secretaria de Estado da Emigração e Comunidades Portuguesas).
Sabendo o que sei hoje, teria deixado o Governo depois da morte de Sá Carneiro.
Voltaria, certamente, com Mota Pinto para o governo do "Bloco Central" e, de seguida, deixaria a política, de vez...
Os "meus" governos foram apenas esses três. Nos outros estive lá e não gostei, embora batalhasse como quem gosta...