agosto 11, 2016

SOBRE FUTEBOL: EM 2011

Destinava-se a ser publicada, em conjunto com outras, mas por razões de varia ordem, não chegou a ser publicada, Aqui fica arquivada É SABIDO QUE É ADEPTA FERRENHA DO FCP: A QUE SE DEVE? Ser do FCP é como ser do Porto e de Portugal. Terra-mãe, Nação, clube são parte de mim, ou eu sou parte deles, como queira... "Nasci no FCP", numa família portista - avós, pais, até tios e primos, quase sem excepções. Em linha recta, descendo de portistas desde a fundação do clube. E sempre tive paixão pelo desporto e, mais ainda, pelo futebol. O que eu sofri em criança, porque o FCP não ganhava um campeonato... tinha 13 ou 14 anos, quando conquistou o primeiro título, nas Antas, frente a uma Académica super-defensiva. Um autocarro negro à frente da nossa baliza. Depois, foi a festa inesquecível, todos abraçados, um delírio! Era a equipa de Yustrich, brasileiro de Minas Gerais, de ascendência alemã, um gigante com dois metros de altura, um ícone para a maioria dos adeptos, embora controverso - teve problemas com jogadores e directores do clube. Um dos meus primeiros heróis, por quem conservo, intacta, a fascinação, com pena não o ter conhecido pessoalmente. A última vez que visitou a cidade eu estava noutro continente. A minha vida itinerante, levou-me a perder muitas ocasiões imperdíveis, como esta... NUNCA ESCONDI O MEU CLUBISMO Julgo que quando existe é bom que se saiba, não há razão para esconder. Um deputado da emigração perguntou-me, ainda nos meus primeiros meses de AR, se isso não me seria prejudicial num círculo onde a maioria é, ou, pelo menos, era, largamente, benfiquista ou sportinguista. Respondi "não", porque as pessoas separam as águas. E, se assim não fosse, paciência, mas não renegava a identidade clubista. Duvido que tenha perdido um só voto por causa do futebol. Os emigrantes são mais abertos, frequentam associações ligadas a outros clubes, com eu frequentava, o Benfica de Toronto, o Lar dos Leões de Newark, sobretudo quando era presidido pela Maria João Ávila. Mas o futebol nem sequer pesa muito a nível local, basta pensar no caso muito concreto do Rui Rio : o confronto com o FCP de Pinto da Costa faz parte da estratégia de afirmação pessoal desse autarca. Parecendo que não, ele fez política com o futebol, em nome de uma espécie de superioridade intelectual e ética. e, apesar da cruzada anti-portista, ganha eleições no Porto, para além de ganhar boa imprensa em Lisboa. Isto também é aproveitamento do futebol, é uma parte da realidade, não a realidade inteira. O futebol pode, igualmente, servir, por exemplo, para aproximar homens e mulheres que a política divide. A primeira vez que isto se tornou evidente, na Assembleia da república, foi quando tivemos a ideia de festejar vitórias europeias do FCP, convidando para jantar no restaurante de São Bento, os principais dirigentes do clube. Por graça, alguém falou até de "grupo parlamentar do FCP", com deputados de todos os partidos. A mais viva recordação que me ficou desses convívios foi a dissertação da Natália Correia (portista "por afinidade", via Dórdio) sobre a simbologia do "dragão", parente próximo da serpente da antiga Lusitânia. Os deputados dos outros clubes "compraram" a ideia e estes convívios tornaram-se comuns - sem a mais valia dos discursos de Natália. É sempre simpático o clubismo dos outros, com fair-play - caso do Presidente Jorge Sampaio, que, na cerimónia de imposição de condecorações, quando me colocava a faixa da Ordem do Infante D Henrique me disse: "Está a ver, a sua condecoração até tem as cores do FCP!". E de facto, as cores da "Ordem do Infante" são o azul e o branco (mais uma faixa preta, que não conta, para este efeito...). Jorge Sampaio é especial, em tudo, um "gentleman" para usar uma língua que ele fala tão bem! Penso que a sua postura face ao futebol é a melhor: gosta sem complexos, tem clube coração (o SCP), não mistura política nessa relação afectiva e respeita as opções dos outros. A começar pela da Dona Maria José Ritta, que é algarvia e portista... FUTEBO E POLÍTICA O que é mau é usar as influências de um sector no outro - e infelizmente isso tem-se verificado, por vezes. Não pode evitar-se nem negar-se o facto dos políticos, quase todos, terem o seu emblema de clube, e o de a generalidade dos dirigentes ou adeptos de clubes terem uma bandeira partidária. Impróprio é usarem a sua posição num dos domínios para intervir no outro, dando apoios indevidos, aplicando, ou distorcendo, regras conforme conveniências. Com clara consciência disso, tive sempre uma grande preocupação da isenção, enquanto estava no Governo. Sou jurista e gosto de aplicar o Direito, a direito, como deve ser. A lei é para cumprir, mesmo que prejudique os meus, ou aproveite a outros. Foi o caso da emigração de jogadores do SCP (por puro acaso eram do Sporting), a quem, com um despacho, "abri" as fronteiras, em 1979, por pura convicção jurídica. FCP e SLB estavam na oposição. Foi a altura em que Séninho, do FCP também foi para um "all stars" americano, mas esse tinha idade e tempo de clube tal, como exigido pela PRT (portaria de regulamentação de trabalho), então em vigor, que eu considerei inconstitucional, por prejudicar o direito de livre circulação. Nas comunidades, tratava as delegações locais dos clubes da mesma maneira - são instituições das comunidades, como quaisquer outras, abertas e conviviais. Também não negava o mesmo apoio, se se tratasse do FCP - estive presente no seu histórico 1º congresso de delegações e filiais, que já incluía bastantes delegações do estrangeiro, embora muito menos do que actualmente. O futebol, tal como a cultura em geral, e o folclore em particular, é, na ligação dos emigrantes ao país, importantíssimo. E na relação com os PALOP's, se possível, ainda mais. Nesses países, o povo pode gostar mais ou menos da nossa selecção, mas é ainda parte integrante dos grandes clubes portugueses. São fiéis adeptos! É pena é que esses clubes não considerem prioritário aprofundar contactos. É pena que seja praticamente ignorada pelos governos esta vertente da cooperação. Opinião subjectiva, eu sei. Mas o futebol faz parte da minha vida e da vida de muita gente, com quem me identifico, milhões, por esse mundo fora. Os políticos que lançam um olhar snob sobre o futebol - e aqui são tantos! - não podem compreender isto... Fiz títulos de jornais, algumas vezes, quando respondi que ser do FCP e ser do PSD são coisas de diversa natureza - do clube sou desde o berço até à morte. Ao partido aderi depois dos 30 nos e pode não ser para sempre. Eco nos media tiveram também as "guerras" com Mota Amaral, a partir do momento em que ele resolveu sancionar com falta injustificada a ida dos deputados à final de Sevilha, como convidados do FCP. Na sua maioria nem eram do PSD, eram socialistas. Do PSD, que me lembre, só a Leonor Beleza e eu. Injustificou a falta, porque assistir a um desafio de futebol, não podia, segundo ele, ser considerado trabalho político. "Trabalho político" compreende, em regra, tudo o que deputado entender ser missão sua, enquanto parlamentar. Uma banal exposição, uma entrega de qualquer prémio numa Escola, a inauguração de uma rotunda de aldeia não costumam levantar dúvidas. Se calhar, até uma final europeia de futebol, com outro clube, também não levantava... Escrevi uma carta a dizer que o ser ou não "trabalho político" dependia das circunstâncias concretas, do propósito, do interesse da representação, avaliada pelo deputado, ele mesmo. E acrescentei um exemplo: se um deputado vai numa procissão religiosa, como peregrino, isso não é trabalho político, é devoção. Se for convidado pela Irmandade ou pela Autarquia, ou pelo Governo para estar presente, já pode merecer a qualificação de trabalho político. Segundo me disseram, Mota Amaral tinha feito uma deslocação "oficial" aos Açores, com comitiva e tudo, para assistir às festas do Senhor Santo Cristo. Não contestou a argumentação, mas manteve o "diktat". A final da "Champions", em Gelsenkirchen, no ano seguinte, serviu de segunda volta deste combate. Quando, no final, que o FCP ganhou por três golos, um jornalista lhe pediu um comentário, o José Lello, que nem é portista, respondeu: Porto 3, Mota Amaral, 0... Curiosamente, o comentário, tão bem achado, não foi dado à estampa... Depois de muito obstaculizar as celebrações portistas com as suas deslocadas interpretações regimentais, o Presidente da Assembleia da República não foi convidado para a inauguração do "Dragão" e o grupo parlamentar do PSD terá querido impor, por solidariedade para ele, a ausência dos seus deputados na cerimónia. Não sei ao certo, não estive nessa reunião do "Grupo" - mas noutra, mais plácida, algures no centro da Europa - com pena de perdido a discussão sobre o assunto. Os jornalistas, ao verem-me na inauguração, perguntavam-me, todos, se isso me iria causar grandes problemas. Respondi que não, que um partido democrático tem de permitir que cada um pense pela sua cabeça e decidir o sentido das suas solidariedades. E, se assim não fosse, entre o clube e o partido escolhia o FCP. Fui notícia, a letras gordas, no "Público"... SOBRE MOURINHO Não vou esconder que, no início, tal como, mais tarde, a maioria dos ingleses, achava Mourinho um pretensioso, com ar de galã de telenovela. Insuportável! Os ingleses converteram-se a Mourinho bem mais depressa do que eu. O braço de ferro (ainda que curto) de Mourinho com Vitor Baía retardou a minha "estrada de Damasco" em relação àquela divindade do futebol. Mas sei que aquando da final de Sevilha, já o considerava "especial". E não vou mudar de opinião. Torço por ele, onde quer que esteja, até mesmo no Real Madrid (horror dos horrores, o clube da capital das Espanhas!). Como toda a gente, reconheço que ele é genial enquanto treinador, como portuguesa agradeço-lhe a imagem de Portugal que projecta. No meio do cinzentismo geral dos nossos dirigentes, ele é absolutamente, gloriosamente exótico, turbulento, assertivo, convincente. Já não direi arrogante. O que noutro seria arrogância nele, é afinal, auto-confiança sustentada na excelência em estado puro. Quem mais poderia considerar-se o melhor do todos, com naturalidade, e ser, reconhecidamente, o melhor de todos? Os seus excessos fazem parte do "pacote" global... Assim Mourinho fascina o mundo - e me fascina a mim, também. Mas gostar, gostar, desde o primeiro minuto, gosto de Villas-Boas! No caso dele, ao reconhecimento da "classe" como treinador e como pessoa, junta-se um laço mais afectivo - pelo portista, pelo rapazinho que, ainda "teen-ager", já encantava Robson com as suas teorias. Foi fantástico o percurso no FCP 2010/11! Dentro e fora dos estádios. Tão bom no jogo, como nas conferências de imprensa. Portuense e muito "british". "Um "inglês" do Porto, na melhor tradição da novela de Júlio Diniz, que, quando menina e moça, era a minha preferida. André, onde quer que tenha êxito (e não sei se terá, neste Chelsea, mas terá, mais tarde ou mais cedo...) reparti-lo-à com a cidade e com o País. DSOBRE BAÍA Ao contrário do que aconteceu em relação a Mourinho, a admiração por Baía nasceu logo que o vi a defender a baliza do FCP - tão jovem e já um fenómeno, um super guarda redes. Tão elegante na forma de se lançar à bola, a dar ao futebol aquela "nota artística" que poucos conseguem. Creio que foi o Carlos Magno quem disse que até nos seus raros falhanços, falhava com elegância. Mas, além disso, tornou-se rapidamente, mais do que um simples atleta excepcional - um símbolo de desportivismo e de coragem, de resistência à adversidade que o perseguiu - lesões terríveis e demolidoras campanhas de imprensa, sempre à espera do mais pequeno deslize para o transformar em coisa grande. Teriam feito desanimar qualquer outro. Tudo isso o tornou uma figura carismática, um mito, muito antes de abandonar a carreira. Um eterno rosto do FCP, pelas suas qualidades, mais o seu amor ao clube, tão raro numa época de "profissionalismo", que é uma maneira diplomática de condescender com o facto do futebol se ter tornado um grande negócio, e de os protagonistas procurarem fama e dinheiro, onde quer que isso seja mais fácil. Baía é uma raridade e nele reencontramos o sonho da pureza primordial do futebol. É um de nós, ama o FCP, como nós, e é um dos maiores jogadores portugueses de todos os tempos, o melhor de todos os guarda-redes. Meu Pai dizia "eu vi jogar o Pinga" como quem participou em momentos históricos. Eu poderei contar aos mais pequenos como era o Baía, como um estádio inteiro se levantava e vibrava com a simples menção do seu nome. Para mim, o FCP é sempre o FCP. Mas o FCP de Baía e de Deco (o tal que era melhor que Pelé, como se cantava, em coro, nas Antas e no Dragão) nunca mais terá igual. Há jogadores que, de facto, fazem uma época, para além de fazerem uma equipa, como Deco, que foi, nos tempos do Porto e do Barça, o melhor nº 10 do mundo. O mágico da nossa selecção (e tão mal agradecidos fomos, por fim, com Queiroz). O “magic”, na Catalunha. No Conselho da Europa, tinha um colega catalão, que me dizia: "Não imaginas como o Deco é adorado em Camp No". Ele ia ao estádio. Eu não, mas imaginava. Até pela tv se percebia o ambiente que cercava Deco, e o carinho com que Deco acompanhou o princípio da ascensão de Messi. Que pena não serem da mesma geração! Houve outros mágicos, que vi em acção: Hernâni, Pavão, Cubillas, Anderson (nos poucos meses que jogou no Porto, porque em Manchester já não o deixam jogar assim), “Homens-golo”, como Jaburú, Gomes - outro fenómeno, o "bibota" de ouro, que eu já conhecia da equipa de juniores - ou Jardel, que há-de voar para sempre sobre os centrais, na voz de Rui Veloso, numa canção com letra de Carlos Té. E uma longa lista centrais, que o FCP transfere para as Ligas da Europa, a peso de ouro… Há o calcanhar de Madjer… O “slalom” de Derlei (outro eterno herói, o Ninja!) para a vitória no relvado manhoso de Sevilha. O olhar intenso de Pedro Emanuel, na hora de marcar o "penalty" de Yokohama… E agora o Hulk, esse espectáculo dentro do espectáculo... A verdade é que eu tenho uma paixão de infância pelo futebol e pelo FCP, da qual não vou curar-me nunca... SOBRE PINTO DA COSTA Pinto da Costa é o melhor presidente de um clube de futebol do sec. XX - e continua igual a si próprio no século. XXI. Nenhum clube deve a uma só individualidade ascensão semelhante à que o FCP conseguiu com ele. E, através do sucesso do clube, muito lhe deve também o País. Portugal nunca ganhou com a selecção os títulos europeus e mundiais que o Porto lhe deu, no mais mediático dos desportos. Obviamente, Pinto da Costa não realizou o milagre portista sozinho, soube rodear-se, criar estruturas, escolher bem. É um "case study", a nível internacional, sem dúvida. E a nível interno, também tem um lugar na história, como o único Homem do seu tempo que conseguiu pôr o Porto e o norte na vanguarda de Portugal e até da Europa. A região norte está em alta no futebol e em queda nos índices económicos, no desemprego, no investimento público, no poder político... Qualquer uma das Regiões Autónomas pesa politicamente mais do que todo o Norte. Só no futebol houve uma certa forma de regionalização, de diminuição da desigualdade de oportunidades entre a capital e o resto do País. Isso permitiu ao FCP e a outros clubes, do norte e do sul, vencerem campeonatos e taças, como acontece, normalmente, nos outros países da Europa: a França não se resume ao Paris Saint-Germain, nem a Inglaterra ao Arsenal de Londres, nem a Itália ao Roma, nem a Espanha ao Real _Madrid... Na Alemanha, o título pode ir parar a qualquer cidade, nem sequer fica sempre na Baviera. Em Portugal, antes do 25 de Abril, só dava Lisboa, SLB ou SCP. No futebol, Pinto da Costa desencadeou um movimento que podemos comparar ao da descolonização... Fez, claro, no trajecto, muitos inimigos, tanto pelos resultados alcançados como pelo seu estilo inconfundível. Não podendo vencê-lo dentro do campo, os inimigos tentam o objectivo em jogos de secretaria e em processos kafkianos.

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