outubro 23, 2009

Formas de presença e ausência do emigração portuguesa - resumo

Tradicionalmente os emigrantes portugueses eram considerados como ausentes da vida do País, enquanto durava a sua estada no estrangeiro.
A "ausência" implicava, nesta forma de conceber o relacionamento entre os emigrantes e as instituições da terra de origem, uma ruptura de laços do ponto de vista jurídico-constitucional, uma "capitis diminutio", a perda do estatuto de direitos políticos, ou da própria nacionalidade, e, mais latamente, de direitos à protecção social e de acesso a prestações culturais.
Era, assim, segregada uma parte substancial do Povo Português - mais ou menos um terço da totalidade.
Apesar da constatação das múltiplas formas de "presença", da sua efectiva e muito visível participação na vida do País e no desenvolvimento das comunidades locais, apesar do peso financeiro extraordinário de incessantes remessas, de investimentos vultosos, de grandes obras de solidariedade e beneficência, nunca, até ao nosso tempo, esses dados de facto se traduziram, no plano jurídico, em restituição de direitos perdidos ou em execução de medidas ou políticas de apoio.
Ainda menos conhecido e reconhecido foi, ao longo dos séculos XIX e XX, o carácter expansivo dado à língua e à cultura portuguesa pela existência de comunidades de emigrantes - comunidades em sentido sociológico, fundadas, mantidas e transmitidas, de geração para geração, por movimentos associativos de grande dimensão e representatividade. Ou seja, uma outra forma de vencer o distanciamento do território pátrio.

2 - As primeiras e tardias políticas de protecção social dos "ausentes", que, por tantos meios se fazem "presentes" na vida nacional - para além dos apoios limitados ao acompanhamento das viagens de partida ou ao repatriamento, em casos extremos de pobreza - têm início no final dos anos 60.
A viragem acontece em 1974, de súbito, com a restauração da democracia e a proclamação da igualdade entre todos os portugueses, onde quer que residam (Constituição de 1976, com as emendas introduzidas nos sucessivos processos revisionais).
As referidas formas de "presença" dos emigrantes", como parte integrante da Nação - cerca de 10 milhões de residentes no território e de 5 milhões em "diáspora" - obrigaram o Estado democrático a reestruturar as suas instituições e as suas leis para corresponder a esta realidade nacional.
A partir da Constituição, das Leis Eleitorais, da Lei da Nacionalidade e de normativos jurídicos que equacionam, em favor dos emigrantes, a regra da igualdade em todos os domínios da vida nacional se procura alcançar a "prática da igualdade", a igualdade real - apesar de grandes avanços, nem sempre lineares, ainda uma utopia...
A meta é o pleno reconhecimento de uma Nação populacional, que na sua verdadeira dimensão, largamente extravaza o território, e que, nos 5 continentes do mundo, a Portugal se liga por formas diversas, que é preciso saber integrar nos nas leis e nos projectos nacionais, para que sejam verdadeiramente nacionais - conjugando o que alguns chamam a "a comunidade política nacional" (convertida num círculo muito restrito de cidadãos eleitores, por força da lei e por outros factores, também, tais como o desinteresse das próprias pessoas e o descaso dos governos) com a "comunidade nacional" incondicionalmente aberta a todas as formas de ser e sentir Portugal.
É um desafio bem actual. Ao sistema falta eficiência e até, desde a última reforma legislativa, coerência interna. Os emigrantes votam nas eleições legislativas, em dois círculos próprios, com apenas 4 representantes em 230 - única excepção à regra geral da proporcionalidade - e nas eleições europeias, através da livre inscrição nos cadernos eleitorais. Já na eleição para o Presidente da República, reconhecido desde 1997, são, agora, várias a condicionantes que vedam o acesso ao universo eleitoral. Nas eleições municipais e na das Assembleias Legislativas das Regiões Autónomas é excluída toda e qualquer participação.
Completa o sistema de representação dos expatriados um orgão consultivo, o Conselho das Comunidades Portuguesas, eleito por sufrágio directo e universal, com base no recenceamento para a eleição parlamentar.
A comparação com as soluções mais abertas e bem sucedidas, encontradas na ordem jurídica espanhola, e na sua prática administrativa, poderá ajudar o legislador e os políticos portugueses a repensarem um sistema que conhece, actualmente, retrocessos na lei, tal como nos níveis de participação, de facto.

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