abril 17, 2020

Portugal, Camões, as Comunidades

Dia de Portugal, de Camões…

Originalidade nossa, bem portuguesa, a de celebrar o "Dia Nacional" evocando um Poeta.
O maior de todos: Luís de Camões. Homem de grande cultura, de superior engenho, génio que brilha entre os génios da literatura universal, mas igualmente um patriota, um "homem do mundo", que cruzou os mares distantes nas caravelas quinhentistas... Emigrante, como tantos outros Portugueses, antes e depois do seu tempo de vida.

…e das Comunidades

Este é, também, o dia em que o País se revê no espelho da História e no do presente, em tamanho natural - ou seja, na verdadeira dimensão que foi e continua a ser a sua, a de um “Portugal- Nação” que convive dentro e fora de fronteiras.
É excelente lembra-lo no simbolismo da palavra, mas há que ir além da mera comemoração ritual, sempre envolta na nostalgia de uma grandeza perdida há séculos... É preciso, também, saber dar força e dinâmica à realidade da Nação do século XXI, tão cheia de potencialidades em risco de se perderem, por omissão nossa...
Este dia das comunidades portuguesas deve ser o momento de repensar as políticas da emigração, de dar enfoque à sua trave-mestra - ao princípio de igualdade de direitos e deveres entre portugueses dos cinco continentes - para refundação de um espaço de conhecimento, de convivialidade, de cooperação entre nós.
A concepção de um Portugal como "Nação de Comunidades", Nação populacional construída, no tempo presente, pelos cidadãos da Diáspora, a par dos residentes no território nacional, deve muito a Francisco Sá Carneiro. Não é o precursor desta ideia de Pátria, que norteava já, por exemplo, Adriano Moreira na organização dos "Congressos das Comunidades de Língua Portuguesa", nos anos sessenta, ou que refulgia, literariamente, no discurso oficial do 10 de Junho, depois do 25 de Abril (recordo, especialmente, o de Vitorino Magalhães Godinho, logo nos primórdios de mandato do Presidente Eanes).
Porém é, sem dúvida, a Sá Carneiro que se deve a transposição desta ideia de "Nação de Comunidades" para a teorização e cumprimento de um programa político, com novas leis e novas práticas, durante o seu breve Governo, em 1980.
Imenso era o desafio, enormes foram os obstáculos postos pela oposição parlamentar à prossecução, nesse ano e nos que se seguiram, das políticas para a cidadania plena dos emigrantes. Cidadania em sentido lato, abrangendo para além da política (direito de votar nos diversos processos eleitorais, direito a representação específica, o direito à dupla ou múltipla nacionalidade...), outras vertentes, no domínio cultural (apoio ao ensino da língua, da história, à preservação das tradições) e no social, no plano individual ou no colectivo.
 Por isso, o apoio, em qualquer daqueles dois a domínios, começou por ser muito centrado no movimento associativo e nos “media”, aos quais se reconheceu um papel fundamental, bem mais determinante para a existência do admirável mundo das comunidades portuguesas do que o do próprio Estado, quase sempre interessado nas remessas dos emigrantes e pouco preocupado em os defender nas sociedades estrangeiras onde trabalhavam – um posicionamento que só se alteraria a partir do final dos anos sessenta e, sobretudo, com a restauração do regime democrático e com a visão Sá-Carneirista da nossa diáspora e as políticas pioneiras, prosseguidas na década de oitenta: com a criação do Conselho das Comunidades (de raíz associativa), em 1980, aspropostsa de alargamento e facilitação do recenseamento no estrangeiro, a lei da dupla nacionalidade (iniciada em 1980 e concluída em 1981)... Na mesma linha de intervenção jurídica, mais tarde, depois de muita polémica e resistência da esquerda tradicionalista, o voto nos “referenda”, ou para o Presidente da República (1997) e para o Parlamento Europeu (apenas em 2004!), estando ainda por conseguir o sufrágio nas autárquicas e nas regionais.
Tão importante quanto o estatuto de Direitos dos Portugueses do estrangeiro, foram as políticas de aproximação ou proximidade, então chamadas “políticas de reencontro”, isto é, de diálogo entre comunidades e entre elas e o país, para lhes dar voz, visibilidade e reconhecimento, nomeadamente através do Conselho das Comunidades. Aproximação que era ainda mais urgente no caso das comunidades transoceânicas, sempre mais esquecidas pelos governos do que as da Europa.
Três décadas depois, a modernidade destas formas de acção é uma evidência - a realidade exige-as, mais do que nunca.
 Enganaram-se os que julgavam que Portugal deixara de ser um país de emigração. Na verdade, o exôdo hoje traduz-se em números que excedem todas as expectativas e experiências do passado. São os jovens (e os menos jovens, mulheres e homens…) que circulam, livremente, às centenas de milhares dentro das fronteiras da União Europeia, são os empresários, pequenos, médios ou grandes, que demandam países em extraordinário desenvolvimento, como o Brasil ou Angola… Novas comunidades se vão, assim, juntar às antigas. Não necessariamente idênticas, mas, ao que esperamos, movidas pelo mesmo sentimento de pertença à Nação portuguesa.
Neste quadro, não sei se amanhã seremos menos de dez milhões no território, mas tenho a certeza de que seremos mais de quinze milhões na totalidade e que temos de nos saber situar, com grande dinamismo e coesão, dentro e fora do País, no mapa geográfico das comunidades portuguesas.

Maria Manuela Aguiar
Junho 2011

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