janeiro 28, 2009

In illo tempore

PARA MAIS TARDE COMENTAR





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8 comentários:

Maria Manuela Aguiar disse...

Começo por comentar o prémio do Rotary Club, que, julgo eu, era anualmente atribuído aos melhores alunos finalistas do Liceu.
Fiquei, como é evidente, encantada com a perspectiva de ganhar um diploma, entregue num jantar de gala. Nunca tal me tinha acontecido, e sempre gostei de novidades.
Mas logo surgiram os inesperados contratempos.
O "Rotary" é uma respeitável ONG internacional. Porém, no antigamente, tudo o que era internacional levantava suspeitas. Tudo o que náo era situacionista, assumia contornos muito subversivos!
A família "temia" que eu fosse conotada com a "subversão"...(já assim pensava por outras razões, hélas!).
Consultados alguns sacerdotes amigos, deram parecer negativo...
Pelo visto, achavam que uma instituição daquelas queria apenas estender o seu campo de recrutamento, entre a incauta "nata" da juventude (como, aliás, faziam os directores de colégios de freiras ou os seminários, entre as ou os meninos bem comportados e piedosos...).
Tive que me impôr. A ONG, não era governamental, certo, mas estava perfeitamente legalizada, o jantar era público, eu ia acompanhada pelos pais, e para receber um papel, não para assinar ou assumir um compromisso. Era tudo transparente.
Vá lá!
Os meus pais não ficaram convencidos, mas não quiseram estragar-me as férias. E, argumento de peso, eu tinha, por mim, os vistosos resultados académicos, que estavam na origem do convite. Não era fácil dizerem-me "não".
Acabou por ser, para eles e para mim, um simpático convívio (num hotel do Porto, não tenho absoluta certeza qual). Depois, os membros do selecto grupo de estudantes (também não sei se eram apenas os finalistas do Liceu - creio que não, que abrangeria, igualmente, universitários)foram chamados ao palco, um a um, e receberam o diploma e um envelope.
Houve discursos. Enalteceram as nossas promissoras qualidades e lamentaram não terem possibilidade de nos dar mais do que um prémio simbólico.
Nada que me entristecesse. Não esperava outra coisa, como comentei com um colega, à despedida. Porém, ele teve suficiente curiosidade para abrir o envelope e exclamou: 500 escudos!
Espreitei o meu, e lá estava a grandiosa nota, impecavelmente nova!
Surpresa e alegria!
Na época, ir ao cinema, se bem me lembro, custaria uns 10 escudos, o mesmo, pouco mais ou menos, que um livro de bolso.
A nota deu para muita leitura e muita frequência das salas de espectáculos do Porto e de Espinho!
E, embora nunca tenha pertencido ao Rotary, é uma instituição com a qual me sinto muito solidária.
O convívio seguinte, entre Rotários, aconteceu uns 25 anos depois, e na qualidade de conferencista, num jantar em Lisboa. Um segundo convite, que nunca poderia recusar, é claro...(e mal eles sabiam poquê!).

Maria Manuela Aguiar disse...

O meu 7º ano do liceu, feito como aluna do Raínha Santa Isabel, (depois de ter "penado" durante 7 anos, num internato, entre a 3ª classe e o 5º ano - e digo isto,já que não tenho vocação para a disciplina e a programação da vida num internato, mesmo em se tratando do elitista "Sardão"...)rendeu-me muitas surpresas, todas agradáveis. O chamado "Prémio Nacional" (dado ao malhor aluno que tivesse finalizado o curso, em cada liceu do País), o prémio do Rotary, e, depois, um prémio excepcional do SNI para os
vencedores do "prémio nacional". Estavamos em 1960. O ano do centenário do Infante Dom Henrique. E, no contexto dessas celebrações, lembraram-se de oferecer, aos ditos estudantes, uma viagem e estadia de uma semana em Marrocos! O norte de Àfrica, onde a aventura Henriquina se iniciou. Ceuta, Tânger... Alcácer Kibir ( de triste memória, como é óbvio, embora, sem responsabilidades do Infante, há muito desaparecido, quando Dom Sebastião ali cumpriu o seu e nosso fado...).
Foi a minha 1ª viagem de avião - para mim, então uma perigosa aventura aérea.
Um dos meus companheiros de viagem foi, imagine-se, o Mota Amaral, em representação de Ponta Delgada. E a minha colega de Direito e amiga, Helena Vaz, do Liceu da Beira.
Desta feita, nem pais nem conselheiros religiosos levantaram objecções. O SNI era um anfitrião acima de toda a suspeita...
Na foto de jornal, aqui reproduzida (eu assinalada pela pena da minha Mãe...) até somos considerados uma espécie de "Jet set"...

Maria Manuela Aguiar disse...

3º documento: uma bolsa que me foi oferecida, para estudar sociologia em "Northwestern", e que eu recusei. preferindo o folclore parisiense, no pós Maio de 1968, como bolseira da Gulbenkian.
É a única coisa de que, verdadeiramente, me arrependo, na vida.
Apesar dos bons amigos, e das boas recordações que trouxe de Paris.

Maria Manuela Aguiar disse...

De uma coisa me não arrependo: de ter aceite o convite para assistente, na minha universidade, a univ. de Coimbra.
Um espantoso convite, perfeitamente fortuito, porque aconteceu num encontro, sobre questões de segurança social, com o famoso criminalista Doutor Eduardo Correia, meu antigo professor. Estranhei que ele ali estivesse, em matérias que não eram da sua especialidade. E, ainda por cima, ele tenta, de imediato, aliciar-me para dar aulas na Faculdade de Economia de Coimbra. E quando eu, ingenuamente, confessei que não sabia da existência de uma faculdade de Economia na cidade , ele respondeu, com a maior naturalidade: "Há. Eu sou o Director".
Embaraçada com a "gaffe", aceitei o convite, naquele minuto.
Estávamos em Janeiro ou Fevereiro de 1974. A burocracia arrastou-se, e só tomei posse a 24 de Abril.
Depois da cerimónia, voltei a Lisboa, onde a revolução me surpreendeu.
Poucos dia depois,o Doutor Eduardo era o Ministro da Educação, e eu vi-me como assistente de Boaventura Sousa Santos.
Iconoclasta, brilhante e entusiasmado com o curso da revolução.
Começamos a preparar iniciativas destinadas às comunidades circundantes, nas quais contaríamos com o apoio logístico das carrinhas do MFA. Eu propunha-me dar, com a sua concordância, cursos de "sindicalismo" e de "feminismo". Infelizmente,não houve, nesse ano académico, 1º ano da universidade, mas antes uma uma extensão do curso do liceu (12º ano):
Goraram-se os meus propostos cursos - um dos quai me teria tornado pioneira dos "Women Studies" em Portugal...
Um outro encontro ocasional com o Doutor Ferrer Correia nos "Gerais" terminou no convite para transitar para a Faculdade de Direito. Quando respondi com um imediato "sim", ele admirou-se muito, ao contrário do que acontecera, meses antes, com o Doutor Eduardo. E até me admoestou:" Olhe que eu estou a falar a sério!" . Ao que eu respondi: "Eu também. O mais possível!"
Nessa noite, recebi um telefonema do Doutor Alarcão, a convidar-me para ser sua assistente, na cadeira de Teoria Geral do Direito. Uma vez mais , aceitei, sem hesitação.
Amanhã, contarei o resto da história, que culmina no evento que deu origem à notícia do jornal.

Maria Manuela Aguiar disse...

Coimbra, nos anos 74/76, numa qualquer Faculdade, tinha alguma coisa em comum com os tempos pós Maio de 68, na Sorbonne ou em Vincennes.
Não nas origens de acontecimentos históricos muito diversos, mas nas suas consequências, no clima e na agitação social que se lhes seguiu , numa espécie de vertigem de mudança, que se vivia, entre incertezas, esperanças, conflitos
afrontamentos, excessos, solidariedades...
Uma vertigem festiva, ainda que já se adivinhasse o fim de festa.
São tempos em que as pessoas como eu se sentem particularmente confortáveis, porque, finalmente, estão na vida (até aí tão previsível), como se estivessem numa sala de espectáculos.
Sim, eu lamento ter trocado a possibilidade de estudo mais sério, em Chicago, pela Paris mais festiva, em 1968/70, mas a verdade é que passei, em França, como estudante, dois anos inesquecíveis!
E, depois, em 1974/76, fui uma feliz assistente da Faculdade de Direito e não trocaria por nada deste mundo, as experiências que a era pós revolucionária aí me permitiu. Não vou contar muita coisa. Só uma ou outra pequena história de época - de uma época irrepetível.

Maria Manuela Aguiar disse...

Apesar de viver, nesse tempo em Lisboa, e, por sinal, muito bem, com uma autêntica governanta, à moda antiga, como já não há, e uma espantosa cadela (não sei se raça "serra de Aires", se "cão de água português", mas, em qualquer caso, um fenómeno) não tive sombra de dúvida em aceitar um lugar de assistente da Universidade de Coimbra, com um diminuto ordenado, em comparação com o que ganhava no "Centro de Estudos" do Ministério das Corporações e Segurança Social...
Uma das razões teve a ver com o meu "feminismo" visceral. Vários colegas do meu curso foram, com classificações semelhantes, convidados para a Faculdade de Direito, e eu não, porque era mulher. Nunca suportei bem as discriminações de género, e muito menos essa.
Quando, quase uma década depois, o convite surgiu - porque estava no lugar certo, na hora certa (e ao verem-me antigos professores, e amigos (impulsivamente e numa conjuntura mais favorável, já de fim de regime e de preconceitos...)decidiram recrutar-me para as suas hostes acdémicas - não resisti a lançar-me numa experiência que, verdade seja dita, sempre tinha desejado.
Sabia que não ía ficar para sempre. Era tarde demais para seguir, com provas de doutoramento e outras provações, uma carreira académica, que é particularmente longa em Direito, pelo menos em Coimbra.
Queria prestar um "serviço temporário" o melhor que pudesse.
A primeira incursão no ensino, na Faculdade de Ciências Humanas da Católica de Lisboa, como assistente na cadeira de Sociologia.
Foi, digamos, de molde a encorajar-me a repetir, sem receio.
Entre mim, em qualquer idade, e a juventude a corrente passa, em geral, como dizem os brasileiros, "bem demais".
Em Coimbra, isso foi evidente, ainda mais evidente.
Estava em casa, na minha Faculdada, a dar a matéria de que mais gosto (teoria geral, direito civil - pode parecer bizarro, mas
gostos não se discutem!).Pertencia às pedras do ligar...
Mas, por outro lado, era o mais consumado exemplo de "outsider".
Porque era mulher, claro...
Porque não dependia de ninguém, de nenhum "patrão", não querendo fazer carreira, nem ficar por muitos anos...
Porque me movia, sobretudo, a curiosidade de conhecer o lado de lá, o dos docentes, na Faculdade onde me formara, como discente.

Pensando em termos de "luta de classes", era como se, por uma breve e intencional mudança de campo,fosse apenas desvendar o seu mistério.

Maria Manuela Aguiar disse...

Aí tive, como, depois, várias vezes, teria, alguns conflitos com os "superiores hierárquicos". Muito mais benignos do que os que se seguiram na política... Questões de sensibilidade, de opinião, nada que afectasse as relações pessoais e mesmo a amizade.
Mas não tive um só, pequeno e insignificante que fosse, incidente com alunos.
Que gente simpática!
No 1º ano, dei práticas de "Teoria Geral". Ter alunos em aulas práticas era "obra", naqueles tempos, onde nem certezas havia de se realizarem exames de fim de curso ou cadeira...
Mas eu tinha uns "fieis", que apareciam sempre. Quando eram mais de 10 ou 12, ficávamos, tranquilamente nas salas de aulas, algumas escuras e tristes. Mas, quando eram menos, o que acontecia, com alguma frequência, eu convidava-os para tomar um café, no adjacente bar da Faculdade de Farmácia. Primeiro, tirava as dúvidas sobre a matéria, precisamente como faria na sala de aulas. E, depois, passávamos à análise da situação política. Quase todos eram de esquerda ou de extrema esquerda, enquanto eu era, declaradamente, PPD e Sacarneirista, mas convivemos muito democraticamente!
Confesso que eu já nem me lembrava disto. Mas, há uns 3 anos, na abertura de um seminário em que participei, em Fafe, relembrou-o o Senhor Presidente da Câmara, que foi um desses jovens.
Era, de facto, como ele contou, que as coisas se passavam.
Admito que, sem a revolução, eu não pudesse ter organizado aquelas aulas "peripatéticas", num convívio tão saudavel e natural com os meus alunos de grande estimação.
Acho que sempre tive consciência disso. Do que não tive, foi do facto de esse gesto ter sido, mesmo em pleno PREC,visto como tão iconoclasta...

Maria Manuela Aguiar disse...

Com o CATEDIN, o que se passou, obedeceu à mesma lógica de conseguir os melhores resultados pedagógicos pelos meios mais acessíveis e agradáveis para todos.
Quando os alunos voluntários do Porto me pediram para lhes dar "práticas" nos fins de semana, em Coimbra, eu, que gosto de estar em casa, em Espinho, pertinho do Porto, contrapropus dar as aulas "intensivas" no centro da Invicta...
Ideal para eles, ideal para mim!
O Prof. Alarcão não achou mal. O Director da Fac. de Letras, Prof, Oscar Lopes, cedeu-nos instalações.
Foi um sucesso.A solução generalizou-se... Havia muitos outros assitentes, a residir na cidade, ou que se prontificavam a fazer a viagem.E até catedráticos, com o Prof. Mota Pinto a ser o 1º.
Náo fiz nada demais, embora tivesse, efectivamente, dado os primeiros cursos de Coimbra "extra-muros".
Fiz por gosto e fiz de graça, naturalmente.
Quando deixei Coimbra, eles ofereceram-me um belo almoço de despedida. E continuaram, nos anos seguintes, a convidar-me para os seus convívios anuais!