outubro 04, 2020

CAMINHOS DA POESIA LUSO GALAICA QUE PASSAM POR ESPINHO 1 - A Galiza celebrou, no passado sábado, 25 de julho, o Dia da Pátria Galega. Entre nós, o acontecimento passou, sem o merecido destaque. E, no entanto, na sua origem simbólica, aquela celebração tem muito a ver conosco, porque o seu o foco é posto na matriz cultural identitária e não em feitos bélicos, conquistas, glorificação de heróis guerreiros, como acontece por esse mundo fora. Com outra exceção, a portuguesa! No dia nacional, tembém nós, evocamos o Poeta maior e convocamos para a festa, a Diáspora, ou, seja, todo o espaço em que se ouve a língua, O da Dia da Galiza é o do seu santo patroeiro, o Apóstolo Santiago, unindo crentes e não.crentes numa ideia de espiritualidade, de afirmação da cultura ancestral, a que se associam, o nome de Rosalía, a grande Poeta que cantou a sua terra.. A comemoração começou há apenas um século, em 1920, como projeto das "Irmandades da Fala", instituições criadas para a defesa do património histórico e imaterial mais precioso, a língua-mãe. Durante o franquismo, o "Dia da Pátria Galega" esteve proibido e a comemoração manteve-se somente onde não chegava a autoridade repressiva da Ditadura, na Diáspora Galega, que tem vida própria, estruturas e dimensão comparável à nossa (embora mais concentrada em países do sul da América). A proibição ficou de pé, alguns anos após a democratização, sendo, depois, convolada numa permissividade ambígua, na envolvente política em que se afrontam o centralismo castelhano e o nacionalismo ou autonomismo galego. A partir da década de oitenta, o Governo Autonómico fez sua a comemoação, integrando-a no calendário oficial, embora, conforme o quadrante político, esta ora seja assumida no seu significado mais amplo, ora reconduzida à vertente religiosa, sem que falte, o ritual de uma missa por Rosalia. Pena é que, em 2020, ano do centenário da própria instituição do Dia da Galiza, os festejos tenham sido tão parcos - por causa da pandemia, mas. igualmente da subsistência de querelas partidárias e ideológicas. Em qualquer caso, enquanto o Rei Filipe VI de Espanha, (ou das Espanhas...), e o Poder Autonómico participavam em ofícios religiosos na Catedral de Santiago, muitos foram os cidadãos que, nas ruas, apesar da COVID, se manifestaram. 2 - Na relação da Galiza com Portugal, temos de saber contornar os escolhos desta realidade, sobrepondo ao imediatismo da conflitualidade política do presente (a vivência da autonomia lá, o regionalismo adiado, cá), aquilo que é perene e vem de tempos imemoriais, a língua originária, o galaico.português, e as afinidades antigas que hibernam em nós. Já algumas vezes publicamente contei como fui, eu própria, individualmente cimentando, o meu sentir, a minha consciência de uma identidade luso-galaica. Era menina, mas já queria conhecer mundo, ver o estrangeiro e, um dia, no início da década de cinquenta, finalmente, os pais fizeram-me a vontade, levaram-me com eles até Vigo, pela fronteira de Tuy. Gostei do passeio, do que vi, mas voltei desapontada. Tudo me pareceu "pouco estrangeiro" - as casas de pedra, a convivência das pessoas nas esplanada e cafés, os rostos das pessoas e até o falar, que entendia sem dificuldade de maior..Alguns anos mais tarde, já depois muitas idas a Vigo e de conhecer cidades como Paris, Londres ou Ceuta, passei férias no Alentejo e no Algarve, férias magníficas, cheias de sol e de surpresas... a cor ocre das fragas, paisagens áridas e amplas, a placidez dos camponeses, e o seu sotaque, as casas caiadas, com barras coloridas azuis e amarelas, a geometria do casario branco, de pátios e açoteias... Em suma: terras exóticas, onde chegava sem cruzar fronteiras guardadas pela polícia! E, assim, com um simples olhar em volta, compreendi que o meu país, tal qual a Espanha (e não ao contrário da Espanha, como pretende o nosso ortodoxo centralismo) é multicultural, com tradições comunitárias e regionais as mais diversas. E logo vi nesta diversidade uma riqueza, e um fator de coesão e não de deslace, no contexto português de unidade política milenar.da Nação organizade em Estado. . . 3 - Por outro lado, reconhecendo que mil anos de separação política não conseguiram desfazer as sintonias naturais do Norte português com a Galiza, ou do Algarve com a Andaluzia, faço da valorização deste fenómeno uma causa minha.. Deixemos ao Estado o que é de César, as suas fronteiras terrestres e as sua leis, e sigamos o sentir dos Povos! O domínio em que queremos mover-nos é o da Cultura, máximo denominador comum, não o da políticaque divide.. Nas zonas fronteiriças, sabemos que é denso e frutífero o interrelacionamento dos dois lados do rio Minho, quer da parte dos autarcas, quer das sociedades locais, pessoas e instituições. Contudo, quando nos afastamos da raia, a presença da Galiza parece esvair-se na distância....Surge, por isso, como paradigmática e rara a iniciativa nascida em Espinho, pela mão de uma Espinhense: Ester de Sousa e Sá, escritora, poeta e artista plástica, que vem trazendo a Galiza, a sua veia literária até nós, em simultâneo, pondo a nossa cidade no mapa da Cultura galega. Ao longo dos últimos três anos, o movimento, ao qual ela deu o impulso pioneiro, não parou de crescer - movimento de Poetas das duas línguas em que se prolonga a antiquíssima fala comum. A divulgação da sua obra poética processa-se, assim, a um ritmo anual: a primeira Coletânea de Poesia Luso Galaica, teve o seu lançamento em Espinho, na Biblioteca José Marmelo e Silva, a 13 de Outubro de 2018, a segunda (Coletânea de Poesia Galaico-Lusa - Poetas do Reencontro), em Chantada, a 26 de Outubro de 2019, a terceira (Coletânea Luso Galaica - Caminhos da Poesia) está agendada para Espinho, já a 5 de estembro deste ano. A organização das recolhas de inéditos, sua edição e lançamento cabem alternadamente, a Portugal e à Galiza. E como cada Coletânea tem apresentação, cá e lá, as "Bienais de Poesia" ocorridas, alternadamente, na Galiza e em Espinho, dão lugar a uma multiplicidade de confraternizações de poetas, de músicos, e cultores de outras artes, que vão ganhando contornos de institucionalização. Os Poetas assumem-se, deste forma, lucida e eficientemente, como mediadores na aproximação das suas comunidades, num universo cultural em expansão. Juntos caminham, tendo por lema, e cito, "a Poesia dunha matria sen fronteiras"..

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