novembro 22, 2010

O risco de viver...

O risco está sempre presente nas nossas vidas. A percepção do risco é que varia, para uma mesma situação.
Recordo a conversa de dois estrangeiros, que seguiam ao meu lado, num autocarro de Lisboa, há pouco tempo. Dizia um para o outro (em inglês) que os portugueses tinham a mania de que a cidade era perigosa, quando, de facto, era das mais seguras do mundo. E o amigo concordava... Na opinião deles, raiavamos a obssessão, em termos de complexo de insegurança.
Não sei se tinham inteira razão, mas, de qualquer modo, estes dois olhares sobre uma só realidade exemplificam o que quero dizer.
Ali era o povo que estava em causa, mas poderia ser igualmente qualquer famoso político... Há os que se sentem mais ou menos visados por eventuais ameaças à integridade física.
Num extremo está o prudente Cavaco Silva, que ninguém imagina a escapar à mínima regra de segurança (e que até se queixa das falhas de segurança dos computadores da presidência) e no outro os despreocupados Mário Soares ou Sá Carneiro. É, a meu ver, uma questão de feitio, de cálculo do risco também, não uma questão de "ética da responsabilidade"!
Confesso que fiquei profundamente chocada pela forma como o mais recente biógrafo do Dr. Sá Carneiro apresenta esta sua faceta de menorização do papel ou das virtualidades da segurança que lhe era imposta, nas funções de Primeiro Ministro. Para ele, trata-se de uma "irresponsabilidade", que chega ao ponto de adjectivar de pueril!
Leva o assunto a peito, dedica-lhe muito mais espaço do que às inúmeras realizações e polémicas políticas que, pura e simplesmente, omite. A "petite histoire" interessa~lhe bem mais do que a história que se fez, sector a sector, nesse governo extraordinário.
Só nos faltava esta: classificar os nossos Homens de Estado, pela sua capacidade de obediência aos ditâmes do guarda-costas!!!
E o pior é que por este critério "chumbavam" os dois políticos mais notáveis do século XX português, Sá Carneiro e Mário Soares - e ficavam todos os medianos, ou todos os medíocres, mais o Ditador, que de preferência nem se deixava ver em grandes ajuntamentos!
É quanto basta para chumbar o critério...

2 comentários:

Maria Manuela Aguiar disse...

Segundo o próprio biógrafo, Sá Carneiro lembrava o caso de Kennedy, a quem não escasseava a segurança, que, porém, na hora decisiva não bastou para o salvar.
Como não salvaram Sá carneiro e Amaro da Costa do atentado de Camarate.
Ridículas precauções, que protegiam contra pacíficos vizinhos e transeuntes, o Sr Primeiro Ministro, mas não curavam das condições de voo de um Cessna, que ficou estacionado na aeroporto, ao alcance de qualquer autêntico terrorista!

Maria Manuela Aguiar disse...

Claro que a "descontracção" dos políticos que relativizam a importância das medidas redutoras da sua liberdade de movimentos, pode causar alguns calafrios num anfitrião ocasional. Acontecia normalmente com os do Dr. Mário Soares... Recordo-me de um cônsul do Rio de Janeiro, que me contou quanto se sentia aliviado depois da partida do Dr. Soares, são e salvo, a caminho da Pátria, no avião da TAP. É que, contra todas as recomendações que lhe tinha feito, o detectara, na véspera, a passear sozinho no calçadão de Copacabana, já depois da meia-noite...
E porque suspeitava que tal pudesse acontecer, andava o Cônsul-Geral no seu carro, para trás e para diante, na marginal, para intervir, se preciso fosse...

Quem conhecesse o Dr. Soares adivinhava que, acompanhado à porta do hotel por um diplomata obviamente amedrontado com o ambiente circundante, não resistiria a fazer o contrário do que lhe era recomendado.

Quem não tem medo, não tem!
E não há maneira de o convencer de perigos em que não acredita...
Duvido, porém, que o tal biógrafo tratasse o Dr. Soares, como trata o Dr. Sá Carneiro, pela mesma razão...